Especial

Um ano depois, saiba o que dizem as entidades envolvidas na tragédia com lancha em Mar Grande

Adenilson Nunes
A reportagem conversou com a Marinha, Agerba e uma das empresas que realizam a travessia Salvador x Mar Grande  |   Bnews - Divulgação Adenilson Nunes

Publicado em 24/08/2018, às 11h20   Brenda Ferreira e Diego Vieira


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O ano é 2017, 24 de agosto. Mais uma manhã normal para moradores do município de Vera Cruz, na Ilha de Itaparica, que utilizam o transporte marítimo para desembarcar em Salvador. Só que, desta vez, o trajeto não foi concluído com sucesso. A lancha Cavalo Marinho I naufragou com 120 passageiros, deixando 19 vítimas. 

Davi Gabriel Monteiro Coutinho, 6 meses, Darlan Queiroz Reis Julião, 2 anos, Dulciana dos Santos Queiroz, mãe de Darlan, 38 anos, Dulcelina Machado dos Santos, avó de Darlan, 59 anos, Laís Pita Trindade, 20 anos, Taís Medeiros Ramos de Sales, 32 anos, Thiago Henrique de Melo Muniz Barreto, 35 anos, Antônio de Jesus Souza, 67 anos, Ivanilde Gomes da Silva, 70 anos, Isnaildes de Oliveira Lima, 48 anos, Lucas Medeiros Leão, 2 anos, Rita dos Santos, 54 anos, Rosemeire Novaes Carneiro da Costa, 49 anos, Sandra C. Lima dos Santos, 40 anos, Lindinalva Moreira da Silva, 50 anos, Edilene Oliveira dos Santos, 43 anos, Edileuza Reis da Conceição, 53 anos, Alessandra Bonfim dos Santos, 36 anos e Salvador Souza Santos, 68 anos. Filhos, pais, avós, mães e tias vítimas de uma tragédia que se estende há um ano na justiça. 

Após este tempo, surgiram questionamentos sobre o possível culpado e, diante do jogo de empurra, até hoje o caso não foi encerrado e sobreviventes e familiares das vítimas seguem sem respostas. 

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Dando continuidade à reportagem especial do 1° ano da tragédia, o BNews buscou as autoridades envolvidas no acidente e questionou a competência de cada entidade. A Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia (Agerba), apesar de ter sido apontada pelos familiares das vítimas como culpada pela falta de fiscalização, a Marinha do Brasil apontou, em inquérito, que a empresa não tem relação. 

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BNews: O que compete à Agerba relacionado às travessias?

Agerba: No sistema de travessia Salvador x Mar Grande cabe a Agerba conceder e regular as linhas, estabelecer e fiscalizar tarifas, cumprimento de horários das embarcações, limpeza, conforto nos barcos e serviços de atendimento prestados ao usuário. Além disso, fiscaliza os serviços prestados nos terminais marítimos de Salvador e Mar Grande (Vera Cruz), bem como funcionamento e condições.

BNews: Na época da tragédia, a Agerba estava ciente das condições da Cavalo Marinho I?

Agerba: Os documentos e licenças da Cavalo Marinho I estavam em dia. A Agerba atuou dando assistência às vítimas/familiares, além de acompanhar os inquéritos instaurados pelos órgãos competentes. Após reuniões e orientações da Marinha, a Agerba ainda definiu uma nova resolução que dispõe sobre o transporte de bagagens de mão por passageiros nas embarcações operadoras da Travessia, especificando as características gerais dos volumes.

BNews: Como os usuários podem denunciar más condições ou falta de equipamentos de segurança, caso notem?

Agerba: Em caso de dúvidas, reclamações, denúncias ou elogios, os usuários do sistema podem entrar em contato com a Ouvidoria da Agerba através do telefone 0800 071 0080 ou e-mail [email protected].

BNews: Como é feita a fiscalização dessas lanchas administradas pela Agerba?

Agerba: Atualmente conta com 16 fiscais que atuam no sistema de lanchas e no Sistema Ferry-Boat, diariamente, tanto na capital como em Vera Cruz e Ilha de Itaparica, fiscalizando os itens mencionados. Além disso, acompanha toda a documentação, como licenças e comprovantes de vistorias exigidos pela Marinha, para que as embarcações possam compor a frota do sistema hidroviário. Em caso de não renovação de algum documento, a embarcação sai imediatamente de circulação.

BNews: As empresas pagam alguma taxa ao estado para explorar o serviço? Se sim, qual o valor?

Agerba: As empresas que detém a concessão para a exploração do serviço de travessia Salvador x Mar Grande pagam ao Estado uma taxa proporcional ao número de passageiros. O valor cobrado é de R$ 0,28 centavos por passageiro pagante.

A Agerba é uma agência reguladora e fiscalizadora de serviços públicos de transportes. No transporte intermunicipal hidroviário de passageiros a agência regula, concede e fiscaliza os serviços de travessias Salvador x Mar Grande, Catamarã Salvador x Morro de São Paulo e o Sistema Ferry-Boat Salvador x Itaparica.

Em janeiro deste ano, durante apresentação do inquérito pela Marinha do Brasil foram apontados como responsáveis pelo acidente o engenheiro técnico, o dono da empresa CL Transportes, por negligência, e o comandante da embarcação, por imprudência. O inquérito da Marinha tem quase 1.200 páginas e foi encaminhado para o tribunal marítimo, onde permanece.

Procurada, a entidade esclareceu funções e orientou a população acerca de segurança pessoal e das embarcações. 

BNews: O que compete à Marinha no que diz respeito a fiscalização?

Marinha: No tocante às atividades de transporte marítimo, à Marinha do Brasil compete fiscalizar o tráfego aquaviário visando ao cumprimento de leis e normas da Autoridade Marítima relacionadas à segurança da navegação, salvaguarda da vida humana no mar e em águas interiores, além da prevenção da poluição hídrica por parte de embarcações, plataformas e suas instalações de apoio. As principais atividades de fiscalização executadas pela Marinha do Brasil são a Inspeção Naval e a Vistoria Naval. 

A Inspeção Naval é uma atividade de cunho administrativo, inopinada e realizada por meio de abordagens a embarcações em navegação ou atracadas, quando há a verificação dos documentos da embarcação e da tripulação, dos equipamentos de segurança e salvatagem, da lotação e do estado geral da embarcação. 

Já a Vistoria Naval é uma perícia técnica obrigatória, realizada pela Capitania dos Portos, que visa à verificação do cumprimento, por parte da embarcação vistoriada, dos requisitos pertinentes de segurança da navegação, salvaguarda da vida humana no mar e prevenção da poluição hídrica, preconizados nas normas da Autoridade Marítima e nas Convenções e Códigos Internacionais, resultando na emissão de certificados ou atestados correspondentes. Trata-se de uma ação conduzida por profissionais especializados, programada com o propósito de manter a embarcação com a documentação legal exigida.

BNews: A companhia tem acompanhado as embarcações que fazem o trajeto Mar Grande -  Salvador?

Marinha: Todas as embarcações que fazem a linha Mar Grande - Salvador são rotineiramente inspecionadas e obrigadas a cumprir a rotina de vistorias previstas no seu respectivo certificado de segurança da navegação. Só são liberadas para a navegação as embarcações que cumprem os requisitos estabelecidos pelas normas da Autoridade Marítima, que são verificados por ocasião das inspeções e vistorias realizadas pela Capitania dos Portos. 

BNews: Com qual periodicidade é feita a fiscalização?

Marinha: [As fiscalizações] São realizadas diariamente, inclusive em finais de semana e feriados. Já as vistorias navais seguem uma programação estabelecida para cada embarcação. Nas embarcações que fazem a travessia Salvador – Mar Grande, as vistorias são realizadas anualmente.

BNews: Após o acidente em Mar Grande, as fiscalizações foram intensificadas?

Marinha: As equipes de Inspeção Naval da CPBA continuam a realizar ações diárias de fiscalização de embarcações que operam nos terminais de passageiros instalados no interior da Baía de Todos os Santos, em fiel observância às normas da Autoridade Marítima. Durante tais ações, a Capitania vem dando maior foco em aspectos que podem contribuir para minimizar riscos.  

Segurança

BNews: De que forma os coletes devem estar disponíveis para os passageiros?

Marinha: Os coletes salva-vidas deverão ser armazenados de maneira que possam ser prontamente utilizados, em local visível, bem sinalizado e de fácil acesso. As embarcações que navegam em águas interiores, como é o caso da Baía de Todos os Santos, deverão dispor de coletes salva-vidas na proporção de um colete de tamanho grande (para pessoas com peso entre 55 e 110 kg) para cada pessoa a bordo. As embarcações empregadas no transporte de passageiros deverão ainda ter a bordo uma quantidade de coletes salva-vidas adequada para crianças (colete tamanho pequeno) igual a, pelo menos, 10% do total de passageiros, ou uma quantidade maior, como for necessário, de modo que haja um colete salva-vidas para cada criança. 

BNews: Quais são os itens de segurança obrigatórios? As lanchas que fazem esse trajeto para Salvador têm?

Marinha: Coletes salva-vidas para todos os passageiros e tripulantes, boia salva-vidas, artefatos pirotécnicos, uma embarcação de sobrevivência, extintor de incêndio, luzes de navegação, rádio VHF, Sistema de Identificação Automática (AIS), dentre outros. Todas as lanchas que realizam esse tipo de travessia devem possuir tais itens de segurança e salvatagem. Caso seja verificada alguma deficiência, a lancha pode ser notificada ou impedida de navegar.

BNews: Caso as regras de segurança não sejam cumpridas, o que é feito? Há algum tipo de multa?

Marinha: Dependendo da infração, o Regulamento da Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (RLESTA) prevê a aplicação de multas, cujos valores variam de R$ 40 a R$ 3.200, a apreensão da embarcação, a suspensão da habilitação por até 120 dias e, em caso de reincidência, o cancelamento definitivo da habilitação do condutor.

BNews: O que a população pode fazer se notar algum item faltando?

Marinha: Obrigatoriamente, o número de telefone da Capitania dos Portos deve estar exposto em local visível dentro das embarcações de transporte, de maneira a permitir que os passageiros que verificarem alguma irregularidade possam denunciá-la. A participação do cidadão é bem-vinda e pode contribuir com o trabalho de fiscalização realizado pela Capitania dos Portos. O telefone da Capitania dos Portos da Bahia (71) 3507-3777 é atendido 24 horas por dia, todos os dias do ano, inclusive em finais de semana e feriados.

As empresas

A CL Transportes, responsável pelo acidente, e a Vera Cruz, empresas que fazem o trajeto Mar Grande x Salvador, também foram procuradas pela reportagem, mas apenas a Vera Cruz respondeu aos questionamentos. 

Após um ano do acidente, a Vera Cruz Serviços informou, em nota, que independente do acidente, as lanchas são docadas a cada quatro meses para realizar manutenções. Porém, foram incrementados treinamentos de Combate a princípio de incêndio e Resgate de Homem ao Mar aos marinheiros. 

Conforme a empresa, foram instalados também aparelhos que permitem rastrear as Lanchas via GPS.  “Além disso, colocamos em todas as lanchas placas explicando como vestir os coletes salva vidas, e estamos instalando sistema audiovisual para veicular um vídeo com instrução de uso do colete salva vidas”, concluiu a nota.

A reportagem entrou em contato com a CL Transportes, responsável pela lancha Cavalo Marinho I, através dos contatos telefônicos disponíveis no próprio site da empresa, mas foi informada que o número estava errado e não atendeu às seguintes ligações. 

Classificação Indicativa: Livre

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