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Economia Internacional: Estados Unidos, crescimento econômico e estagnação dos salários

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Bnews - Divulgação

Publicado em 05/12/2018, às 17h16   Cairo Andrade


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No ano de 2108, completamos 10 anos após a grande recessão da economia global iniciada no mercado financeiro americano e marcada pelo pedido de falência do banco Lehman Brothers em setembro de 2008. Na época, milhares de americanos perderam suas casas e seus empregos como conseqüência do colapso financeiro. 

Contudo, atualmente, levantam-se a hipótese de que a economia dos Estados Unidos parece ter finalmente alcançado um caminho estável e seguro para a retomada do crescimento econômico de longo prazo. 

Um dos argumentos utilizados para sustentar a ideia de que o governo americano superou os efeitos da crise são os indicadores que apontam para uma “melhoria no mercado de trabalho”.  Depois de um pico de 10% da taxa de desemprego em outubro de 2009, a atual taxa de desemprego está em 3,9%, sendo o menor patamar pós crise de 2008.

A problemática que se levanta neste artigo é identificar se a crença na recuperação dos EUA, sustentada no indicador do emprego, é o suficiente para acreditar em uma recuperação sólida da economia do país, principalmente considerando que depois da crise de 2008 as políticas neoliberais que originaram a crise permanecem vigentes nos Estados Unidos e no cenário mundial.  Para isto, vamos expor a discussão sobre a evolução dos salários reais - o salário depois de contabilizar a inflação - dos trabalhadores americanos nos últimos anos, além de fazer uma breve contextualização da economia americana nesses dez anos após o colapso financeiro.

Um dos fenômenos recentes que marcam o mercado de trabalho dos países centrais nas últimas décadas e que vem se acentuado desde a crise financeira global, tem sido a crescente participação de emprego de meio período, também conhecido como subempregos; esta parcela agora é responsável por cerca de 20% de todos os empregos na União Europeia. As políticas adotadas para flexibilizar as leis trabalhistas e, como consequência, trazer o aumento da produtividade, demonstram-se ineficazes ao elevar o nível de precarização do trabalhador.

Neste sentido, ponderamos que a atual taxa oficial de desemprego esconde realidades mais preocupantes: um número crescente de trabalhadores contratados sem segurança no emprego e um exército de trabalhadores de meio período desesperados por empregos em tempo integral. Os trabalhadores em tempo parcial são pessoas que trabalham normalmente menos de 35 horas por semana. Em outubro de 2018, cerca de 27,33 milhões de pessoas trabalhavam em tempo parcial.

Já quando observamos a evolução dos salários, notamos que a desconexão entre o mercado de trabalho e os contracheques dos trabalhadores alimentou grande parte do ativismo recente em estados e cidades americanas, em torno do aumento do salário mínimo. O atual presidente dos EUA, D. Trump, colocou a problemática como uma das suas principais promessas de campanha.

No entanto, os dados fornecidos pelo Bureau of Labor Statistic (BLS), departamento de censo dos EUA que usa uma amostra nacional cientificamente selecionada de cerca de 60.000 domicílios elegíveis, com cobertura em todos os 50 estados e o distrito de Columbia, revelou que para os trabalhadores em posições “de produção e não-supervisoras”, o valor do salário médio diminuiu em 2017. Para esses trabalhadores, a média dos salários reais caiu de US$ 22,62 em maio de 2017 para US $ 22,59 em maio de 2018, informou o Bureau of Labor Statistics.

Esse grupo de trabalhadores inclui os que trabalham em manufatura e construção, bem como todos os trabalhadores “não supervisionistas” das indústrias de serviços, como saúde ou fast food. Essa informação é substancial porque esse grupo responde por cerca de quatro quintos dos trabalhadores empregados na América, de acordo com o BLS.

Sem ajustar a inflação, esses trabalhadores “não-supervisionistas” viram seus ganhos médios por hora crescendo apenas 2,8% em relação ao ano passado. Isso não foi suficiente para acompanhar o aumento de 2,9% na inflação, ou seja, houve uma perda do poder de compra desses trabalhadores e, simultaneamente, podemos afirmar que também houve uma tendência de empobrecimento. 

Isso está em linha com a dinâmica dos salários médios nos últimos cinco anos: o crescimento anual variou entre 2% e 3% desde o início de 2013. Mas nos anos imediatamente anteriores ao colapso financeiro de 2007-08, o salário médio por hora muitas vezes aumentava cerca de 4% ano a ano. E durante os anos de alta inflação da década de 1970 e início de 1980, os salários médios comumente subiram 7%, 8% ou até 9% ano a ano. Ou seja, no período recente, os indicadores apontam para uma perda do poder aquisitivo da classe trabalhadora, colocando em risco a qualidade de vida dos trabalhadores. 

Embora o estudo tem apontado para a tendência de queda do crescimento do salário médio do trabalhador nos EUA, ele destaca que mesmo com os altos e baixos dos salários ao longo das últimas décadas, o salário médio real atual tem aproximadamente o mesmo poder de compra que ele tinha há 40 anos. Além do mais, afirma o estudo, os ganhos salariais têm acontecido, em geral, para os trabalhadores mais bem pago. 

Mesmo considerando essa afirmação do estudo, é relevante notar que os indicadores que apontam para a queda dos salários prometem exacerbar os níveis históricos da desigualdade nos EUA, pois os trabalhadores que já estavam ganhando menos estão sofrendo retrocessos com a perda do poder de compra. Isso se torna mais preocupante e coloca em risco a ideia de que a economia dos EUA está se recuperando de forma sólida, pois a retomada do crescimento no período recente está associada a um processo de tendência de concentração de renda, com os ganhos desse crescimento sendo direcionados quase que exclusivamente para as pessoas que já estão no topo da economia.

Cairo Andrade – pesquisador do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Graduando em Economia na Faculdade de Economia da Ufba.

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