Economia & Mercado

Para além da Política Industrial: a Relação entre o Câmbio e a Indústria

Imagem Para além da Política Industrial: a Relação entre o Câmbio e a Indústria
Bnews - Divulgação

Publicado em 07/08/2018, às 21h50   Bruna Bispo e Yuri Dantas*


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Com a aproximação das eleições começam a surgir debates dos presidenciáveis e suas equipes acerca das políticas econômicas que serão adotadas em seus mandatos. A respeito das políticas macroeconômicas, em específico a política cambial, as propostas dadas pela equipe econômica de Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT) mostraram posicionamentos diferentes quanto à influência do câmbio na economia brasileira. 

Segundo Nelson Marconi – economista conselheiro de Ciro Gomes -, manter o câmbio a um patamar de R$ 3,80 a R$ 4,00 é uma proposta válida para impulsionar a indústria nacional. Contudo, segundo o economista Pérsio Arida, coordenador do programa econômica de Geraldo Alckmin, depreciar o câmbio para gerar competitividade industrial não é aconselhável, porque este é resultado de políticas públicas e não deveria ser tratado como uma variável de ajuste da estrutura industrial do país. 

Esses discursos dialogam com o debate da política cambial como um instrumento de compensação das falhas estruturais que as indústrias em países em desenvolvimento apresentam, sendo um mecanismo que poderia proporcionar uma equiparação competitiva no mercado externo, assim como levanta a questão do papel da política cambial como instrumento de controle da inflação. Mas qual é a relação do câmbio com a indústria? 

Entre as políticas macroeconômicas mais influentes para os setores da economia (inclusive a indústria), a política cambial é a mais estratégica, já que ela pode ser essencial para a dinâmica das exportações e para o fortalecimento da indústria de uma nação, de modo que pode-se afirmar que a taxa de câmbio é um instrumento fundamental para promover o desenvolvimento econômico de um país. 

Contudo, a taxa de câmbio pode se tornar um problema quando um país decide implementar uma política de inserção não planejada no mercado externo por meio de aberturas comerciais abruptas e que o câmbio valorizado é usado para facilitar esse processo. Com uma economia mais aberta e taxa de câmbio valorizada, ao encarar indústrias de outros países mais tecnologicamente maduros em setores mais intensivos em tecnologia, os países em desenvolvimento, dada a abundância em recursos naturais, passam a recorrer à especialização em commodities (bens de menor valor agregado) para sustentar os desequilíbrios em suas contas externas, negligenciando a sobrevivência de vários setores industriais desassistidos de políticas industriais que tenham como objetivo manter seu nível de competitividade frente a concorrência internacional. 

Essa fragilidade da pauta exportadora concentrada em produtos de baixo valor agregado é agravada com uma tendência estrutural à sobreapreciação cambial, particularmente quando os preços das commodities estão elevados. Com uma sobrevalorização cambial causada, às vezes, por maiores saldos positivos na balança comercial em decorrência do aumento de exportações de recursos naturais e maior abertura comercial, economias em desenvolvimento – como a brasileira – teriam maiores dificuldades em ingressar nos ramos industriais mais intensivos tecnologicamente pela falta de competitividade da indústria desses países frente ao poderio tecnológico das economias mais desenvolvidas. Desse modo, ao invés de desenvolver uma indústria de transformação mais competitiva, o câmbio valorizado propicia um cenário que contribui para um processo de desindustrialização precoce e reprimarização da pauta exportadora, o que mina a possibilidade de modernização do parque industrial via inserção externa. Essa foi a realidade da economia brasileira desde o início dos anos 1990. 

Por outro lado, uma taxa de câmbio depreciada e uma política de abertura setorial e gradual podem contribuir para modernizar e diversificar a produção de bens de maior valor agregado de um país. Isto é, uma política cambial que conserva a taxa em um patamar competitivo evita que os bens primários e que não necessitam de desenvoltura tecnológica dominem a pauta exportadora, além de estimular a participação de produtos de maior valor agregado por proporcionar maior competitividade a seus preços. Nesse sentido, a depreciação cambial atua como um instrumento catalisador do processo de catching up e corrobora para que o país fique em uma situação menos vulnerável das oscilações da economia global, o que acontece quando se é dependente de commodities. 

Em contrapartida, muitos analistas argumentam que é importante considerar que a desvalorização cambial pode trazer consigo o encarecimento das importações e uma aceleração da inflação (que mexe com o estigma da inflação alta que está encrustado na população brasileira), de modo que este talvez seja o grande dilema quando se fala em política cambial: proteger a indústria ou controlar a inflação? 

Diante desse cenário, dois pontos devem ser levados em consideração antes de se responder a tal pergunta: 1) a experiência brasileira mostra que há 30 anos a taxa câmbio vem sendo adotada como ferramenta de combate à inflação e essa prática tem como efeito colateral a perda de competitividade industrial; 2) o depósito inconsequente de expectativas na exportação de bens primários como elemento estratégico para atrair divisas, equilibrar as contas externas e dinamizar a economia doméstica só a torna mais sensível aos eventuais choques econômicos, além de tornar as tentativas de investimento em outros setores industriais menos produtivas e nada eficazes. 

Assim, um lado da moeda da desvalorização cambial é o aumento da competitividade industrial, o outro, é a alta da inflação. Deve-se ter em mente que para que realmente haja um processo de desenvolvimento econômico, muitas vezes, é preciso pensar em medidas que, apesar de não serem populares a curto prazo, tragam resultados positivos no futuro. Mas, a decisão final depende do posicionamento e da importância que os políticos responsáveis darão a cada lado da moeda. 

* Bruna Bispo -  é pesquisadora do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e graduanda em Economia pela Ufba.

* Yuri Dantas -   é pesquisador do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e graduando em Economia pela Ufba.  

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