Polícia

10 anos do Caso Neylton: partidos providenciaram morte do servidor, diz promotor

Publicado em 04/05/2017, às 09h39   Caroline Gois


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Há dez anos um crime chocou a capital baiana e movimentou os bastidores da política local. No dia 6 de janeiro de 2007, um sábado, o servidor Neylton Souto da Silveira, de 38 anos, foi brutalmente assassinado dentro do prédio da Secretária de Sáude do Município (SMS). O corpo do servidor foi encontrado no pátio interno do prédio da SMS ainda pela manhã e trajava apenas uma camisa tipo gola-polo preta, cueca e uma meia.  Após quase um ano depois, os sapatos sociais e a calça jeans que o servidor trajava foram encontrados nos dutos subterrâneos, por onde passam as tubulações do prédio. Neste dia, segundo a família, o servidor informou que houve uma convocação para que três pessoas, incluindo ele, comparecessem ao prédio. Mas, segundo as investigações, apenas Neylton esteve no prédio. Além dele, os dois vigilantes -  Jair Barbosa da Conceição e Josemar dos Santos. Ambos, condenados a 14 anos de prisão pela morte do servidor. Jair negou a participação. Josemar, em depoimento, chegou a confessar o crime e também afirmar que receberia uma recompensa no valor de R$20.000,00 da ex-subsecretaria municipal de saúde, Aglaé Amaral Sousa, e da ex-consultora técnica da SMS na época, Tânia Maria Pedrosa. Ambas chegaram a ser presas um mês após o crime, mas logo foram soltas e em 2010, o Magistrado da 1ª Vara do Juri não encontrou provas suficientes para mandar a ex-subsecretária de saúde e a ex-consultora técnica da SMS ao Tribunal do Juri, juntamente com os vigilantes. Os desembargadores do Tribunal de Justiça tiveram o mesmo entendimento e com isso, elas foram inocentadas.
Josemar, o vigilante que citou as duas funcionárias da SMS como mandantes, está desaparecido desde 2012. O veículo dele, um Palio, foi encontrado incendiado na Ladeira do Olassá, próximo ao Parque do  Abaeté. O outro vigilante, Jair, que sempre negou participação no crime, foi beneficiado por um habeas corpus e responde o processo em liberdade. 
Funcionário concursado da Superintendência de Engenharia de Tráfego (SET), Neyton trabalhava desde março de 2006 na secretaria, tendo sob sua responsabilidade uma planilha que movimentava, por mês, cerca de R$ 25 milhões de verba do Sistema Único de Saúde (SUS), para pagamentos a fornecedores da SMS. "Entendo que o caso deva ser reaberto. Mesmo porque foram julgados os executores. Os mandantes, sejam eles no sexo masculino ou feminino não foram responsabilizados. O que é muito estranho. Houve na primeira fase do processo o indiciamento de duas mulheres que, ao final da primeira fase, determinaram sendo impronunciadas pelo juiz. Isso ensejou um recursou que foi julgado improcendente. Claro, o MP recorreu. Como elas foram impronunciadas e o crime ainda não prescreveu, o processo pode sim ser reaberto para responsabilizar os mandantes. Porque se trata de crime de mando. Eu não tenho dúvida nenhuma. Precisa de uma investigação maior", afirmou o promotor do Ministário Público da Bahia, Davi Gallo Barouh.
Para ele, todo o processo de investigação soa estranho e envolve os contratos que o servidor teria descoberto. "Outra coisa muito estranha são estes contratos. O que ele descobriu. Ele descobriu uma coisa grande que funciona dentro da secretaria de Saúde da prefeitura. Atá onde se sabe, tinha divisão de propina. Essas propinas mesmo que nós hoje vemos. Havia uma divisão grande que chegava de dinheiro público entre algumas entidades hospitalares aqui de Salvador. Então, foi isso que ele descobriu. E como este dinheiro era divivdido entre alguns partidos, ensejou que algum partido que se sentiu prejudicado providenciou a morte dele. O que aconteceu com Neylton nada mais é do que está acontecendo no Brasil hoje. Como ele era técnico em contabilidade terminou por descobrir falcatruas dentro da secretaria de Saúde e terminou pagando caro por isso. Essas invetigações ficaram no âmbito dele. A Controladoria da União chegou iniciar as investigações. Foi juntada esta documentação no recurso interposto pelo MP e estas peças que nos foi remetida pela Controladoria, simplesmente no Tribunal de Justiça da Bahia foram retiradas do processo e nunca mais apareceram", revelou.
O promotor vai ainda mais além. "Muito coisa estranha aconteceu neste processo. A começar pela impronúncia das duas suspeitas. Não estou dizendo que elas são culpadas. Mas, este caso deveria ter sido submetio à sociedade. Um dos executores as colocou como mandantes. Inclusive, um deles comprou um carro e este carro apareceu incendiado e ele nunca mais apareceu. Na época eu pedi que a Polícia Federal investigasse. O que ele descobriu foi coisa grande", afirmou.
Contratos
Quarenta milhões de reais. Este é o prejuízo total à população, às ações de saúde e ao erário do Município de Salvador por seis anos de terceirização irregular dos Programas Saúde da Família (PSF) e de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) à Real Sociedade Espanhola de Beneficência (RSEB). A fim de reparar os danos causados pela dilapidação das verbas da Saúde na capital baiana, os Ministérios Públicos Federal (MPF/BA) e do Estado da Bahia (MP-BA) propuseram, em julho de 2009, duas ações de improbidade administrativa decorrentes da execução do Contrato 34/2002, que resultou na terceirização dos programas.
As ações de improbidade foram divididas por gestão, já que o contrato vigorou por duas gestões municipais. Uma das ações é relativa ao prejuízo de 25,5 milhões de reais na gestão 2001 a 2004, na qual são réus a ex-secretária de Saúde, Aldely Rocha Dias, o ex-coordenador de Administração da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Oyama Amado Simões, a ex-presidente da Comissão Permanente de Licitação, Maria Edna Lordelo Sampaio e a RSEB. A outra, refere-se ao período de 2005 a 2007, ano de encerramento do contrato, cujo cálculo do prejuízo chega a 14,6 milhões de reais, e em que são réus o também ex-secretário da SMS, Luiz Eugênio Portela, a ex-subsecretária da SMS, Agláe Amaral Souza, e novamente a Real Sociedade Espanhola. A RSEB responde, nas duas ações, por todas as irregularidades apontadas.  
Em 2010, os Ministérios Públicos do Estado da Bahia (MP-BA) e Federal (MPF-BA) ajuizaram três novas ações civis públicas denunciando atos de improbidade administrativa cometidos no âmbito da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) entre 2001 e 2004, durante a gestão da ex-secretária de Saúde Aldely Rocha, que resultaram em um prejuízo de cerca de R$ 11 milhões aos cofres públicos. Autoras das ações, a promotora de Justiça Rita Tourinho e a procuradora da República Juliana Moraes denunciam a realização de terceirização ilegal de serviços, superfaturamento de contratos, vícios em processos licitatórios, pagamentos indevidos, dentre outras irregularidades. Resultado de mais de dois anos de investigações sobre a gestão de recursos federais e municipais pela SMS, iniciadas após a morte do servidor público Neylton da Silveira, em janeiro de 2007, nas dependências da Secretaria, as três ações foram ajuizadas no final de dezembro último, na Justiça Federal, e têm entre os réus a ex-secretária Aldely Rocha, a Real Sociedade Espanhola de Beneficência (RSEB), o Hospital Evangélico da Bahia (HEB) e a Gestmed Gestão e Serviços de Saúde Ltda. Em julho de 2009, as representantes dos MPs denunciaram vícios encontrados na execução de um contrato firmado pela SMS e RSEB para terceirização dos Programas Saúde da Família (PSF) e de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), com prejuízo estimado em R$ 40 milhões.
Segundo Davi Gallo, o papel do MP é buscar a condenação dos responsáveis. "O processo não está prescrito. Claro que ao surgir qualquer prova nova ele será reaberto. Infelizmente, foram colocados vários obstáculos".

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Publicada originalmente em 3/05 às 12h39

Classificação Indicativa: Livre

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