Justiça

TCE: processos com mais de 10 anos não foram julgados

Imagem TCE: processos com mais de 10 anos não foram julgados
Os atrasos podem acarretar em grandes prejuízos aos cofres públicos  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 11/10/2013, às 09h06   Luiz Fernando Lima (twitter: @limaluizf)


FacebookTwitterWhatsApp


No final do mês de setembro chegou à reportagem do Bocão News uma denúncia grave sobre o Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE). O órgão de controle externo tem inúmeros processos não julgados pelo excesso de prazo na devolução dos pedidos de vistas de algum dos sete conselheiros que compõem o pleno.

Existem “pedidos de vistas” com mais de dez anos aguardando devolução. Em um tribunal que tem como obrigação auxiliar na fiscalização e no controle das contas do governo estadual, os sucessivos atrasos não podem ser contemporizados sob pena de grandes prejuízos aos cofres públicos e a interrupção de obras e convênios que podem ser ou não lesivos ao erário. Processos como o 003756/2003, que ficou nas mãos do conselheiro Pedro Lino até o dia 11 de setembro de 2013, são exemplos da morosidade do TCE.

Durante a sessão do Pleno do dia 5 de setembro os conselheiros discutiram os atrasos e as medidas que poderiam ser adotadas, mas não chegaram a nenhuma conclusão. Contudo, o corregedor do órgão, Filemon Matos, trouxe à luz um problema interno que até então vinha passando à margem do grande público.

Após o conselheiro Gildásio Penedo, ex-deputado estadual, apresentar um problema enfrentado na segunda câmara do TCE o debate sobre os prazos foi estabelecido. O regimento interno do tribunal não vem sendo seguido. Os prazos determinados no “estatuto” do órgão de controle foram negligenciados em nome de um entendimento que deixa cada conselheiro “livre” para segurar, trancar e até engavetar processos de interesse público.

Filemon, que vai se aposentar compulsoriamente no final deste ano, desabafou, quando Gildásio sugeriu adotar o prazo de 365 dias para julgamento de contas. “Isso é bobagem”, declarou o conselheiro em resposta a Gildásio. “É bobagem. Na questão do julgamento é bobagem, eu repito isso, porque não existe correspondência, na realidade, que permita o julgamento em 365 dias. E a prova é tamanha, que nós estamos julgando processos desde 2002, desde 2002 isso está engarrafado aí nas contas consolidadas”.

Embora o regimento do tribunal determine o prazo, os conselheiros reconheceram que não o seguem. “Estou repetindo, porque este Tribunal está engarrafado com processo de contas a não sei quanto tempo, sem entrar e sem encontrar o escoamento devido para este Plenário, e isto está gritantemente repetido nos relatórios que eu distribuo todos os meses neste Plenário e que distribuo especificamente para o Presidente da Casa, mostrando ostensivamente esta calamidade que está aí. Aqui, ou nós julgamos devolução de vista de 10 anos atrás, ou nós julgamos recursos, contas desapareceram. O julgamento das contas desapareceu, as contas consolidadas continuam aí como uma esfinge a desafiar todo mundo. Então, falar em tempestividade de 365 dias, hoje, é uma coisa que não tem a mínima procedência, a mínima fundamentação, a mínima exequibilidade, porque estamos aí com os processos atrasadíssimos”.

Ato contínuo, Filemon disparou: “antes de se falar em 365 dias, vamos falar nesse passivo enorme que se encontra no Tribunal, em termos de contas, em termos de auditorias e inspeções que não estão sendo feitas, nós caímos de 400 para cento e poucas por ano. Vamos falar dessa calamidade. Quem está diante de um quadro como esse não pode estar falando em 365 dias, porque está, realmente, negando, pisoteando, a realidade, fazendo vistas grossas a esta realidade calamitosa, insisto eu. E que está aí, e que demonstro isso sempre aqui com os documentos e com os levantamentos, não são palavras”.

Sem resposta

A reportagem do Bocão News procurou o conselheiro Filemon Matos em duas oportunidades. A expectativa era ter acesso ao relatório com a compilação dos processos em atraso, os pedidos de vistas e as perspectivas. Na condição de corregedor, Filemon tem como atribuição produzir estes relatórios e apresentar ao presidente e aos conselheiros.

A assessoria de comunicação do TCE informou à reportagem que o conselheiro não iria receber a equipe. Disse ainda que cada conselheiro é responsável pelo processo que relata ou pediu vista. O presidente Zilton Rocha, também através da assessoria, acompanhou o corregedor.

Denúncia

A denúncia enviada à reportagem concentrava os pedidos de vistas do conselheiro Pedro Lino. Este produziu uma nota oficial explicando as circunstâncias e as explicações para os atrasos. Confira na íntegra:

Os excessos de prazo na devolução dos pedidos de vistas ocorreram em função de motivos diversos, como a sobrecarga de trabalho no TCE, causada pelo grande volume de processos; o nível de complexidade dos casos; a existência de matérias não pacificadas na casa; além da necessidade de amplo estudo e debate sobre alguns temas.

A sobrecarga de trabalho pode ser constatada a partir do grande número de processos julgados anualmente pelo Tribunal de Conta do Estado. Apenas no último exercício (2012), o TCE julgou e apreciou um total de 8.421 processos. Destes, o conselheiro Pedro Lino participou efetivamente do julgamento ou da apreciação de 673. Os conselheiros participam de cerca de 80 sessões plenárias e aproximadamente 80 sessões das câmaras, anualmente, além de realizarem o controle nas áreas da administração pública sob suas respectivas supervisões.

Tal volume de trabalho, somado ao nível de complexidade dos processos, acabam acarretando atrasos. Apesar de indesejáveis, o excesso de processos, o acumulo de trabalho e os atrasos nos julgamentos são situações comuns a todos os tribunais, inclusive no Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar de o conselheiro Pedro Lino participar do julgamento de quase 700 processos por ano, apenas 18 processos tiveram atraso na devolução das vistas, o que representa pouco menos de 3% do total.

Parte dos atrasos nos pedidos de vistas foi ocasionada por matérias que não eram pacificadas no Tribunal de Contas do Estado (TCE), necessitando de amplo debate na casa, o que demandou tempo, a exemplo dos Processos do Promo – Centro Internacional de Negócios da Bahia. Existia uma discussão se o Promo, uma entidade civil- sem fins lucrativos, deveria fazer sua prestação de contas ao Plenário, ou deveria prestar contas à 2ª Câmara. O caso do Promo também foi alvo de questionamentos do Ministério Público e da Procuradoria do Estado, que contribuíram para retardar seu julgamento. Além dos quatro processos do Promo em que houve atraso na devolução dos pedidos de vista, existem outros 14 processos da mesma entidade que ainda tramitam pelo TCE, sob relatoria de outros conselheiros, também com prazo excedido.

Outros casos de excessos de prazo ocorreram porque o julgamento dependia de normatização interna do TCE, como nos processos do Promir - Instituto de Promoção da Saúde e Desenvolvimento Social da Microrrregião de Irecê. O Promir possui figura jurídica de Organização Social, regida por legislação específica, mas o Tribunal ainda não aprovou uma normatização sobre a prestação de contas dos contratos celebrados com este tipo de instituição. Os atrasos ocorreram porque não há como julgar processo de prestação de contas de Organização Social, sem antes o TCE aprovar uma resolução normatizando este tema.


Publicada no dia 10 de outubro de 2013, às 14h48

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp