Política

Diplomatas brasileiros são orientados a frisar gênero é apenas sexo biológico

Reprodução
De acordo com fontes do Itamaraty, a instrução foi formalizada porque o Brasil, ao utilizar essa definição, quer evitar ambiguidades  |   Bnews - Divulgação Reprodução

Publicado em 26/06/2019, às 06h35   Redação BNews



O governo Bolsonaro abriu um novo front na guerra contra ideologia de gênero: a política externa. De acordo com matéria da Folha, diplomatas receberam nas últimas semanas instruções oficiais do comando do Itamaraty para que, em negociações em foros multilaterais, reiterem “o entendimento do governo brasileiro de que a palavra gênero significa o sexo biológico: feminino ou masculino”.

A teoria de gênero estabelece que gênero e orientação sexual são construções sociais, e não apenas determinações biológicas. Já para segmentos da direita, a “ideologia de gênero” é um ataque ao conceito tradicional de família. Em pelo menos duas reuniões, na ONU e na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, os diplomatas receberam a instrução de ressaltar a diplomatas de outros países a visão do governo brasileiro sobre gênero.

De acordo com fontes do Itamaraty, a instrução foi formalizada porque o Brasil, ao utilizar essa definição, quer evitar ambiguidades. Procurado, o Itamaraty afirmou tratar-se apenas da retomada da definição tradicional de gênero. Para Camila Asano, coordenadora da Conectas Direitos Humanos, essa medida pode “comprometer a credibilidade internacional do país”.

“Se tal ordem não for imediatamente revertida, o Brasil se unirá a diplomacias que propagam posições retrógradas em espaços internacionais, ignorando avanços nacionais e globais na luta contra desigualdades e preconceitos”, afirma.

Ela lembra que Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, anunciou no início do ano que o Brasil é candidato a um novo mandato no Conselho de Direitos Humanos da ONU. Uma orientação como essa, diz Asano, “pode e deve ser questionada judicialmente”. A nova instrução do Itamaraty se alinha a inúmeras declarações do chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, e do presidente Jair Bolsonaro.

Ainda segundo a Folha, em discurso em seminário promovido pelo Itamaraty e pela Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) no dia 10 de junho, Araújo criticou o globalismo, afirmando que o conceito promove ideias como a ideologia de gênero, ao lado do “racialismo” —segundo ele, a concepção da sociedade dividida em raças— e do ecologismo, definido pelo ministro das Relações Exteriores como a ecologia transformada em ideologia.

Segundo movimentos de direita, o globalismo orientaria instituições internacionais a interferir na soberania de países e a apagar tradições nacionais. Nesse discurso, Ernesto criticou o globalismo por criar um mundo onde “você não tem mais nação, onde você não tem mais família, onde você não tem mais homem e mulher”.

Antes, em artigo publicado em janeiro na revista conservadora americana The New Criterion, o chanceler atacou a “agenda de esquerda que rapidamente tomou conta da sociedade brasileira”. Para ele, essa agenda incluiria “a promoção da ideologia de gênero, o estímulo artificial das tensões raciais, a troca dos pais pelo governo como provedor de valores para as crianças, a humilhação dos cristãos”.

Bolsonaro menciona frequentemente o combate à ideologia de gênero. Em entrevista ao lado do presidente americano Donald Trump na Casa Branca, durante visita a Washington, o presidente afirmou: “EUA e Brasil são irmanados na fé em Deus, no combate à ideologia de gênero, ao politicamente correto e às fake news”.

Asano afirma que a instrução do Itamaraty pode ter impacto na concessão de refúgios pelo Brasil. “Uma das razões para conceder refúgio é a perseguição, incluindo por questões de orientação sexual e identidade de gênero.”

“Se o Itamaraty orienta seus diplomatas dessa forma, o Brasil pode se distanciar de países que acolhem refugiados perseguidos justamente por essas razões. Isso mancha a reputação do país como referência na agenda de proteção a refugiados”, afirma.

O Itamaraty afirma que o Brasil mantém políticas de proteção a minorias, incluindo LGBTI+, e que também atua em diversas iniciativas de defesa das pessoas LGBTI+ em foros internacionais.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp