Polícia

Nas mãos do tráfico, Recôncavo sofre com falta de segurança e ação das facções

Publicado em 28/01/2015, às 06h19   Caroline Gois (Twitter: @goiscarol)


FacebookTwitterWhatsApp

Violência, tráfico de drogas, mortes, guangues e descaso do poder público com uma das cidades pólo do Recôncavo Baiano. Desde julho do ano passado, o tráfico de drogas tomou conta de Maragojipe, trazendo à mídia um cenário de terror e guerra da cidade que possui cerca de 50 mil habitantes. 
O dia 16 de julho de 2014 ficou marcado como a noite do medo. O saldo das horas de terror: casas foram incendiadas e um morador torturado e executado na própria residência. Identificado apenas como Henrique, o jovem teve os antebraços quebrados e o corpo cortado com golpes de facão. Ele também foi morto com diversos tiros no bairro Cruzeiro. Policiais militares de São Félix, Muritiba e Cachoeira foram acionados na madrugada e chegaram a trocar tiros com os bandidos. Nenhum suspeito foi preso. Ainda de acordo com os moradores, a disputa por pontos de tráfico de drogas entre as facções CP e PCC teria motivado os atentados.


Este ano, na segunda-feira, dia 26 de janeiro, a redação do Bocão News recebeu parentes de Adalfredo da Silva Santos, 33 anos, desaparecido desde o dia 16 de dezembro de 2014. Desesperados e sem notícias do jovem, os parentes já têm certeza que ele foi assassinado. "Ouviram tiros perto do manguezal e uma mulher teria visto, mas não a encontramos para testemunhar. A polícia não vai até lá. Só precisamos do corpo para fazer um enterro digno e liberar o seguro que ele fez para os dois filhos, um de 5 e outro de 7 anos", desabafou, emocionado, um dos familiares que preferiu não revelar a identidade. Conforme a família, Adalfredo saiu cedo de casa, parou na residência de uma tia e nunca mais voltou. "Ele tinha uma casa próximo a um beco onde há facções criminosas. Dias depois o carro dele - um celta, foi encontado incendiado", contaram. 
A reportagem entrou em contato com o delagado da cidade, Adailton Pereira, que falou sobre o caso de Adalfredo, além de relatar uma triste realidade sobre a segurança do município. "Na investigação não foi encontado o corpo. Agora, o Adalfredo tem ligação com o tráfico de drogas e o suspeito de tê-lo matado é o melhor amigo dele, o traficante vulgo Gudo Val, de Gutemberg", afirmou. Ainda de acordo com o delegado, as investigações do caso continuam, entretanto, o efetivo de policiais civis dificulta a celeridade no trabalho da polícia. "Contamos com seis policiais e uma viatura. Além disso, a topografia de revelo da cidade é de 80% manguezal, o que favorece às fugas. O ideal seria, no mínimo, dez policiais para dividirmos grupos e fazermos o enfrentamento", relatou. 
Quando questionado sobre o retorno da Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP), o delegado afirmou que constatemente pede ajuda "e até já mandaram mais três policiais". Em contato com a assessoria de comunicação da SSP, a mesma informou ao Bocão News que o problema de Maragojipe só será amenizado quando forem convocados os aprovados no último certame da Polícia Civil, realizado em 2013, que disponibilizou oportunidades para Delegado de Polícia (100 vagas), Escrivão de Polícia (100 vagas) e Investigador de Polícia (400 vagas). Porém, a Sesacretaria de Administração (Saeb), pasta responsável pelos concursos do Estado, informou através de nota enviada ao site que não há uma previsão sobre quando os aprovados serão chamados. Isso porque, conforme a nota, "para provimento de vagas nos cargos de delegado, escrivão e investigador de polícia, encontra-se em reta final. No final do ano passado, o Estado requereu à Justiça Federal autorização para a convocação de candidatos em situação regular no concurso, aptos ao curso de formação das carreiras. O concurso havia sido suspenso por conta da ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública da União (DPU), motivada pelo não entendimento do processo de entrega de exames biomédicos. Em obediência à referida decisão judicial, o Estado da Bahia reabriu o prazo para que os candidatos que foram eliminados na fase de exames biomédicos apresentassem os exames médicos exigidos. A conclusão do certame é de interesse da administração estadual, que promoveu o concurso justamente com intenção de ampliar o quadro de policiais civis no Estado, fortalecendo a segurança pública, uma das prioridades da atual gestão". 
Enquanto a burcocracia e o descaso dos poderes públicos imperam, o delegado Adailton Perira, que está no cargo há três anos, tenta combater a guerra de facções entre a Caveira, Catiara e É Nois. "São três gangues que atuam em lugares diferentes. Elas atuam também por toda a região, como em Nazaré e Santo Antônio de Jesus e, muitas delas, são ramificações de guangues da capital", afirmou.
A reportagem procurou a assessoria de comuncação da Polícia Militar do Estado da Bahia para saber qual o efetivo de PMs na cidade de Maragojipe. Como resposta, o site obteve a seguinte nota: "A cidade de Maragojipe integra uma região coberta pela 27ª CIPM, unidade esta sediada no município de Cruz das Almas e responsável pela manutenção do policiamento ostensivo também nos município adjacentes. Atualmente, o efetivo disponibilizado para atuar na 27ª CIPM é de 367 policiais militares. O emprego do efetivo nos municípios atendidos pela unidade operacional varia em razão de diversos fatores, tais como, população, área comercial, mapeamento da mancha criminal, etc, assim sendo, o efetivo pode variar entre os municípios após a análise destes diversos dados e a execução do planejamento operacional. Segundo informações colhidas na data de hoje com o comando da 27ª CIPM, estão sendo empregados 40 policiais militares no município de Maragojipe, haja vista estar ocorrendo uma intensificação do policiamento em resposta à demanda de ocorrências na localidade promovidas, sobretudo, pela ação delituosa de pessoas ligadas ao tráfico de drogas na região".
Crime se espalha
Em maio do ano passado, estas gangues atuaram em Cachoeira, também no Recôncavo, expulsando os moradores de suas casas. Conhecida por suas manifestações culturais e histórico que valoriza a região, a cidade localizada a 110 km de Salvador virou mais um palco para a violência que assola o interior da Bahia. A reportagem recebeu denúncias sobre a existência de facções que estão comandando o crime na pequena cidade, com pouco mais de 34 mil habitantes.
O site Bocão News procurou na época o delegado responsável pela cidade, André Alves, que confirmou a denúncia e fez graves revelações sobre a realidade dos moradores deste município. "A violência de um modo geral cresceu. Hoje aqui existe o tráfico de drogas e está fora de controle", afirmou Alves, ressaltando que Cachoeira nunca foi uma cidade tranquilia. "Eu já via Cahoeira nas manchetes. O problema da violência aqui é antigo e terrível", afirmou, estando à frente da DP há dois anos. 
Segundo o delegado, uma das facções surgiu na Ladeira da Cadeia e "eles cooptaram menores. Eram cerca de 15 garotos em média e o grupo ficou conhecido como Facção Mico e Bola", relatou. Entretanto, após a morte de Mico, a facção foi desestruturada e como revelia começaram a perseguir e expulsar populares que moravam na região da Ladeira da Cadeia. "11 famílias foram expulsas em função da morte de Mico como represália", afirmou. Conforme o delegado, a Polícia Militar, Civil e Petros dão suporte na segurança da cidade, porém, há déficit na estrutura que a delegacia possui. "O suporte é mínimo. Temos um Gol que não é viatura e tenho quatro policiais. Recebo o apoio da coordenadoria e apoio das polícias da região", amenizou. Questionado sobre qual pode ser a solução para controlar o tráfico de drogas na cidade, André Alves aposta na implantação de uma Base Militar. "Não vejo outra solução porque quando a polícia sai eles (os ladrões) retornam e conhecem toda a região, o que dificulta a captura", pontuou.
A proposta da construção de uma base em Cachoeira já foi levada até o Comando Geral, conforme afirmou o delegado. A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP) e solicitou via e-mail, conforme sugerido pelo órgão, informações sobre projetos voltados para a segurança no município, bem como, possível instalação da unidade. Até o fechamento desta matéria à época nenhuma resposta foi enviada. "Nossa delegacia é 24 horas e os plantões também são com atendimento emergencial de ocorrências. Hoje, os homicídios estão sob controle", analisou o delegado, revelando que há uma outra facção "que não está incomodando muito e comanda a região do Virador". 
No site da SSP a reportagem conseguiu ter acesso às estatísticas da violência em Cachoeira dos quais estavam disponibilizados este ano os meses de janeiro, fevereiro e março. Neste período foram regitrados três homicídios - um por mês - sendo que em fevereiro o óbito veio após lesão corporal grave.
Enquanto o número de policiais no interior é pífio e não atende à população, esta se vê à mercê daqueles que encontraram no Recôncavo o paraíso do crime, do vandalismo e do terror. 

Nota atualizada às 13h44
Publicada no dia 27 de janeiro de 2015, às 11h20

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp