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'A corrupção começa e termina no Legislativo', aponta Eliana Calmon

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A candidata ao Senado pelo PSB/Rede, Eliana Calmon, visitou a redação do Bocão News nesta segunda-feira (28). Para a campanha eleitoral, a ex-corregedora nacional de Justiça se despiu da toga e desceu da corte para pisar no chão duro da Bahia e este é um dos assuntos tratados nesta entrevista concedida com exclusividade ao Bocão News. A corrupção no Judiciário é outro ponto alto  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 28/07/2014, às 00h00   Luiz Fernando Lima e Juliana Nobre


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A candidata ao Senado pelo PSB/Rede, Eliana Calmon, visitou a redação do Bocão News nesta segunda-feira (28). Para a campanha eleitoral, a ex-corregedora nacional de Justiça se despiu da toga e desceu da corte para pisar no chão duro da Bahia e este é um dos assuntos tratados nesta entrevista concedida com exclusividade ao Bocão News. A corrupção no Judiciário é outro ponto alto deste bate-papo, contudo, quando o assunto é desvio de conduta a ex-ministra garante que o início e o fim de todo o ciclo está no Legislativo.

A candidata ao Senado pelo PSB/Rede, Eliana Calmon, visitou a redação do Bocão News nesta segunda-feira (28). Para a campanha eleitoral, a ex-corregedora nacional de Justiça se despiu da toga e desceu da corte para pisar no chão duro da Bahia e este é um dos assuntos tratados nesta entrevista concedida com exclusividade ao Bocão News. A corrupção no Judiciário é outro ponto alto deste bate-papo, contudo, quando o assunto é desvio de conduta a ex-ministra garante que o início e o fim de todo o ciclo está no Legislativo.

Emocionada, Eliana Calmon evidenciou o perfil combatente e enalteceu a experiência que está vivendo neste momento quando deixa os palácios da Justiça em Brasília para subir em palanque armengado no interior baiano: “eu cheguei no horário (em um comício) e fiquei lá sentada esperando. Eu ficava olhando aquela plateia e comecei a me imaginar fazendo o discurso. Eu estava vestida com uma saia/calça, tênis, uma roupa que eu não usava há muitos anos porque o juiz usa uma roupa formal e a forma que eu chegaria como ministra naquele ambiente era aquela que chega, dá um ‘boa tarde’ – e não está dando bola para as pessoas que estão ali. Geralmente, você vai ali cumprir com seu papel. Faz uma palestra e diz alguma coisa e acabou. Mas aí eu fiquei observando o seguinte. Eu estava lá e preciso deles todos porque todos são eleitores. Então, para você eles são todos importantes, o que não era quando eu era ministra. Eu achei super legal eu ter essa visão de povo. Porque a gente não tem essa visão de povo quando você é autoridade e eu consegui aos 69 anos voltar para fazer essa introspecção que é uma riqueza e tenho certeza de que vou sair muito melhor como pessoa. Eu não estou perdendo tempo ou dinheiro, eu estou perseguindo objetivos e se nada der certo o exemplo fica”.

Enfrentar grandes campanhas ao Senado como a de Geddel Vieira Lima e Otto Alencar também é um dos desafios para a ex-ministra.

BNews – Como a senhora analisa o Judiciário nos dias de hoje?

Eliana Calmon – O Judiciário sempre foi um espelho do que é a sociedade política. Essa corrupção generalizada instalada na política nacional reflete no Judiciário. Eu que entrei no Superior Tribunal de Justiça em 1999 vejo uma diferença na condução dos processos. O Judiciário sempre esteve de mãos dadas com o poder. Embora toda a mudança que se deu na estrutura do Poder Judiciário do mundo foi no sentido de ser mais independente, mais afastado da conjugação política e elite econômica, no sentido de ser mais livre. Mas isso não aconteceu no Brasil porque ficou com uma estrutura muito antiga.

BNews – Estamos falando do Superior, mas quando vamos para as primeiras instâncias, no interior e todas as relações políticas, com empresários, coronéis. Como isso fica?

Eliana Calmon – Tem, mas é menos. Existe sim muita coisa, mas pelo menos você tem para onde correr porque ainda se tem um tribunal. Nas instâncias ordinárias onde os juízes são mais independentes, eles tem um problema muito sério que é a falta de estrutura. Fiz uma trabalho no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e firmei um convênio junto com Joaquim Barbosa para dar conta do provimento 18, sobre improbidades. Quando fiz um curso, um dos exemplos foi: um juiz da Bahia levantou e disse. ‘Ministra, tenho na minha comarca, o prédio do fórum é pago pelo prefeito, os servidores são todos da prefeitura, quero saber como julgo uma ação contra o prefeito porque no outro dia o fórum está fechado’. A conclusão que tiramos é que se tem um poder judiciário sem estrutura na base e independências nos seus tribunais, não se tem nada. Tem um simulacro de poder e faz de conta que está julgando. Ninguém tem medo e a impunidade é um dos grandes instrumentos da corrupção. Dois grandes instrumentos que a corrupção tem é a falta de transparência e a impunidade. Com essas duas armas eles conseguem muitas coisas e aí vem a terceira que é a legislação eleitoral, que é perversa. É tudo mentira. A legislação eleitoral, a justiça eleitoral no Brasil é uma falácia.

BNews – Por que?

Eliana Calmon – Se tem uma reeleição e você permite que o candidato do governo esteja a mais de ano na televisão fazendo propaganda eleitoral. Como você quer igualdade de condições com o candidato? Dilma está a mais de um ano na televisão. Jaques Wagner, Rui Costa. Não estou dizendo que são eles, mas porque são os de agora. Mas é a legislação eleitoral que permite a eles fazerem isso. E o Ministério Público não faz nada porque entende que aquilo não é propaganda eleitoral antecipada. Outra mentira. Eu sou assalariada. Tudo o que eu tenho na minha vida eu conquistei com o meu salário. Tenho um salário bom, mas não é milionário. Eu descobri que de todos os candidatos eu sou a mais rica. Temos que informar à legislação o nosso patrimônio e todos são mais pobres do que eu. Otto Alencar tem um patrimônio muito menor que o meu. Vocês acreditam? É uma mentira. Partimos para os gastos de campanha. Alguém acredita que seja mesmo aqueles gastos?

BNews – A campanha de Geddel está estipulada em 30 milhões de reais. É um grande valor, embora não se saiba quanto será gasto.

Eliana Calmon – Uma campanha a Senador hoje, nos moldes que eles fazem, é de 50 milhões de reais. Para governador é de 150 milhões de reais.

BNews – Qual é a base de cálculo? Estamos aí admitindo uma possibilidade de ‘caixa 2’. Como se pode falar disso em algo mais material? Sabe-se que lideranças de interior pedem dinheiro, mas não temos como provar.

Eliana Calmon – As próprias pessoas que fazem campanha é que falam sobre esses valores. Eu não sabia. Estou até repetindo porque não tenho nenhuma experiência, base para dizer quanto é para cada área. O que a gente vê de derrame de papéis, de propaganda, de televisão, em arte, comunicação. E tudo é feito em nome do poder econômico. A última que vi da Justiça Eleitoral foram as dos cavaletes. Eles só podem ficar de dia. À noite eles precisam ficar deitados ou serem retirados. Eu perguntei por que se bota de dia e se tira de noite. Ninguém conseguiu me dar uma explicação. Mas me deram a seguinte: aquilo ali custa um dinheirão porque tem que botar o caminhão na rua, parar, depois colocar o caminhão de manhã e recolocar. Só quem pode fazer isso é o poder econômico.

BNews – E ainda tem os seguranças que tomam conta das placas para que os concorrentes não a retirem. Já é um outro custo.

Eliana Calmon – Tem uns meninos que ficam debaixo das árvores tomando conta. Isso já é mais um custo. Além dos mini-trios, comícios, carreatas. Me disseram que os bons cabos eleitorais são mantidos pelos candidatos durante todo o ano. Quando chega na época da eleição eles estão ali fiéis. Isso é o poder econômico que impera e um candidato pequeno não tem condição. A não ser um desmiolado. Eu conheci alguns nessa campanha que até hoje estão endividados.

BNews – A senhora é a favor do financiamento público de campanha então?

Eliana Calmon – Não digo que sou a favor porque do jeito que a coisa está, se tivermos o financiamento público de campanha vamos ter o financiamento saindo para o pessoal que já é experiente. Essa legislação só favorece quem já está dentro. Ela não favorece a renovação, que é um dos primeiros princípios da democracia. Se tem uma verdadeira ciranda. Mais uma vez, sem querer personalizar, mas estamos aqui na Bahia, o que se tem de novo nessa política? A única coisa nova que se tem é uma mulher de 69 anos, que sou eu. Lídice [da Mata] não é, [Domingos] Leonelli não é, Eduardo Vasconcelos não é.

BNews – Sendo novidade e disputando um cargo pertencente à casa alta do Congresso Naiconal, a senhora se vê ladeada por Geddel Vieira Lima e Otto Alencar. Com qual espírito, Eliana Calmon entra nessa disputa com dois gigantes da política?

Eliana Calmon – Eu costumo dizer que existe uma coisa que é começar um caminho. E você só começa pelo primeiro passo. Para ter uma pessoa que começa pelo primeiro passo tem de ser uma muito sonhadora ou uma pessoa louca que não meça as consequências. Não posso dizer que não meço as consequências, pois meu pé é muito no chão. Mas sou uma sonhadora, idealista. E minha política é de enfrentamento porque no momento que passei pelo Judiciário, passaram por minhas mãos processos dos mais cabeludos possíveis e vi como as coisas acontecem. É interessante observar que a Polícia Federal é muito competente e consegue mapear tudo. Nos grandes processos que tive consegui formar todo o mapa da corrupção. Ela começa sempre no Congresso Nacional, com as emendas parlamentares. São formados os projetos fantasiosos ou os milionários, são vendidos pelos lobistas, e os congressistas se apossam daquelas ideias e a partir da emenda começa todo o caminho. Os editais para as obras gestados dentro das empreiteiras e começa a distribuição. Cada uma dessas fases tira um naco da verba. Até quando chega na fase final que é a medição da obra, o fiscal do empreiteiro também recebe o seu pedaço. Eu vi isso na construção civil, na prestação de serviços, na parte burocrática da Assembleia Legislativa do estado de Rondônia. É quase uma radiografia do que se tem ali.

BNews – Essas pessoas estão presas?

Eliana Calmon – Eu mandei prender todo mundo. Mas o Supremo soltou tudo e ainda pintaram o ‘diabo’ comigo. Mas o problema não é esse. Eu mandei prender, instaurei o processo e eles foram para os jornais. Isso está nos anais e servirá para alguma coisa. Eu desarticulei a quadrilha. O chefe da quadrilha está preso. Não por esse processo mas por outro antecedente. Esse é tão safado que está preso. Mas o o subchefe da quadrilha, que era o presidente da Assembleia Legislativa não se elegeu mais. Ele pegou o dinheiro da Assembleia Legislativa e jogou na empresa dele. Eu o condenei a 14 anos de prisão. Mas o que quero dizer é que depois de passar por tantas coisas eu vejo que o processo é muito cabuloso. Chego no Judiciário e vejo as dificuldades nas entranhas do poder. Vi cada coisa nos tribunais de Justiça que vocês são capazes de dizer que são mentiras. Por exemplo, no Tribunal de Justiça do Tocantins tirei quatro desembargadores. A presidente do tribunal só pagava os precatórios recebendo 10% do valor.

BNews – Aqui na Bahia voltaram Telma Britto e Mário Hirs e a senhora soltou uma nota dizendo que isso era muito ruim. Qual sua opinião sobre isso?

Eliana Calmon – A decisão de [Ricardo] Lewandowski está certa. O processo entrou em pauta 16 vezes, ela está afastada há oito meses. Não é possível. Quem fez errado foi o CNJ porque não julgou em tempo. Eles não voltaram porque foram absolvidos. Voltaram por decurso do prazo em razão de um afastamento e um processo que não foram julgados.

BNews – Mas isso também é manobra e relação.

Eliana Calmon – E nisso ninguém é culpado. ‘Íamos julgar, íamos condenar’. Bota na pauta, tira da pauta. Pronto, ficou todo mundo bem e Lewandowski levou a culpa. Eu não culpo ele porque se eu estivesse no lugar dele também mandaria voltar. Juridicamente está certo.

BNews – Duas operações que nos chamam a atenção e tem relação com a Bahia é Satiagraha com o banqueiro Daniel Dantas e a Castelo de Areia que é sobre o metrô. Como está esta questão ainda?

Eliana Calmon – Não me pergunte porque os processos julgados eu falo, mas eu não gostaria de falar sobre esses. Existem implicações de ordem moral e que deixam o meu tribunal em situação difícil. Não foi certo. Não é certo para ninguém aos olhos de todo mundo. 

BNews – E como ficamos?

Eliana Calmon – No que nós estamos nessa pseudodemocracia vagabunda. E é por isso que digo: ou nós tomamos conta disso ou isso aqui vai para o espaço. Essa é minha política de enfrentamento. Eu não preciso disso, mas alguém tem de começar a tomar conta. A minha compreensão do que passei e vivi no Judiciário é que ele é o espelho da sociedade a que você serve. Aonde tudo acontece é no Legislativo e é por isso a minha política de enfrentamento. É para dizer o seguinte: os cidadãos de bem precisam se manifestar e serem políticos, mas ninguém quer. Acha que vai sujar a mão, que vai se estragar e desmoralizar. O que eu recebi de conselhos para não fazer isso. ‘Você vai se meter nesse lixo?’. E eu respondi: ‘vou me meter nesse lixo porque alguém tem de varrer isso’. Como é que vamos melhorar? Só pode melhorar se os cidadãos de bem ocuparem os espaços de poder ou virar um guerrilheiro e colocar todo mundo no paredão. Nesse fim de semana eu fui a Arraial D´Ajuda. Um lugar lindo. Mas eu fui ver o outro lado de lá. Nessa campanha tem sido uma lição de vida para mim ao 69 anos. Estou conhecendo aquilo que nunca ninguém me mostrou. Conheci os bairros com esgoto a céu aberto, buracos enormes cheio de lama, ruas estreitas que quase não dá para carro passar, obras inacabadas.

BNews – A senhora se deparou com lideranças de bairro que tem votos e conversou com elas? Geralmente essas lideranças leiloam os votos. Elas tem um contingente de votos que impressionam com garantias de quantas pessoas vão votar. Como se luta para subverter essa regra?

Eliana Calmon – É um negócio, uma máfia. É uma realidade dura. Na Bahia ainda temos muita dificuldade contra isso. O que acontece é que a sociedade está tomando um pouco da consciência sobre isso. É o que Marina Silva diz. Ela conseguiu 20 milhões de votos. O que é muito para uma mulher sem dinheiro, sem estrutura. Quem votou foram as lideranças não capitaneadas pelo dinheiro. Foram lideranças espontâneas da sociedade civil organizada mobilizada. Tenho encontrado muitos movimentos que estão engajados nisso. Encontrei no bairro de São Cristóvão um movimento de combate à corrupção com mais de 3 mil seguidores. Eles são renitentes. Não são aqueles que se proclamam puxadores de votos para ninguém, são apartidários. Optam por alguém que consideram o melhor. Eles fazem campanha conjunta discretamente. São pessoas simples, como professoras aposentadas, vereadores que se deram mal na caminhada.

BNews – Tem muita gente desacreditada na política e a senhora fala de cara nova. Mas de concreto como a senhora vai fazer esse enfrentamento e fazer com que as pessoas que ainda tem esse voto definido passe a enxergar de outra maneira?

Eliana Calmon – Eu já tenho feito isso. São essas pessoas que estou me dirigindo. Lideranças espontâneas. Fui procurada por um pessoal da ONG A procura da Ética Perdida. Esse pessoal está na batalha pelas redes sociais pedindo voto para mim. Eles não falam em partido, abstraem a tudo isso. Porque hoje, partido é uma casa de negócio.

BNews – Como a senhora vê a relação do partido? O PSB tem relação com diversos partidos, embora se apresente como novidade ele não é novo na política. Marina, por outro lado, pensa em política mais voltada para lideranças. Contudo, ela tem dificuldades grandes de discutir pautas progressistas, como legalização e controle das drogas, do aborto. Como vê esses dois pontos?

Eliana Calmon – Entre os dois existe um certo equilíbrio. Para Eduardo Campos que tem uma política muito voltada para o social, mas engajado com a política velha. Por outro lado, a experiência de Eduardo em relação ao que se passou no PT foi dolorosa, porque ele teve que romper com o grande amigo dele, Lula, e verificou que a junção, em nome da governabilidade com a política velha termina fazendo que haja a paralisação. Foi o que aconteceu com o PT. O PT começou muito bem, conseguiu iniciar um grande avanço nas políticas públicas, tirando milhares de pessoas da pobreza extrema levando para a classe C. E aí teve de parar. E parou por que? Porque foi obrigado, em nome da governabilidade e não acontecer como aconteceu com [Fernando] Collor. O extremo de tudo foi o Mensalão, onde se botou um pé na parede. O PT acabou naquele momento. E nesse momento eles tiveram que dar mãos de amigos a [José] Sarney, a Jader Barbalho, [Fernando] Collor até Paulo Maluf, que casaram na igreja com fotografia e tudo. No momento que Eduardo percebeu essa paralisação em razão dessa intercessão ele recuou. De qualquer forma ele teve essa lucidez de não aceitar isso. Então teve o grande encontro com a Marina Silva que dá limites ao Eduardo e ele traz para o PSB e a Rede viabilidade sobre o ponto de vista econômico. Por isso que acho essa terceira via a mais adequada porque não acredito mais no PT que em nome da governabilidade escancarou e a corrupção está absolutamente desenfreada. Não irá conseguir conter a sangria dentro do partido. Em segundo temos o Aécio [Neves], que eu não acredito nessa polarização. Então, a terceira via me parece a mais viável. Ninguém é santo e vai quebrar o sistema de forma absoluta, mas pelo menos eu entendo que o Eduardo Campos é capaz de fazer um governo diferenciado. Isso é imprescindível para a sobrevivência da democracia. É imprescindível darmos continuidade senão vamos virar uma Venezuela ou Cuba. Tive a chance de ir para qualquer outro partido: DEM, PMDB, mas não conseguia me alinhar nos palanques. Mesmo com o sentimento de que partido não vale nada, o PSB é o menos ruim porque é pequeno. E mesmo assim ele teve a chance de comprar outros partidos para ter a chance de coligar. Partidos ofereciam quatro milhões de reais para coligar e não foi porque não teve dinheiro para comprar. Porque a política velha é feita dessas coligações. Ninguém acredita em força viva da sociedade. Marina acredita. Eu pergunto a ela se acredita que eu vou vencer as eleições. E ela diz que acredita. E tem uma porção de gente que diz que acredita.

BNews – E a senhora acredita?

Eliana Calmon – Eu tenho dúvidas. Às vezes quando vejo coisas espontâneas em cidades que eu nunca botei o pé e que vejo pedir material porque quer fazer de sua casa um comitê. As pessoas estão no Facebook pedindo material para fazer comitê nas casas. Então eu digo que isso não pode dar errado. Eu nunca botei o pé nessa cidade, como é que estão acreditando em mim. Temos que acreditar no novo mesmo que não seja para essa seja para a próxima. E de qualquer forma o caminho está aberto. Eu quero sair com o maior número de votos dizendo o seguinte: estou inteira, não me desmoralizei. Entrei na política, fiz o jogo da eleição, mas não o jogo do poder. Não me corrompi. E tenho encontrado muitas ofertas. Oferta para ser subsidiada e ter todo o financiamento de campanha. Ser financiada e me comprometer a votar por determinadas teses quando chegarem ao Senado e também para desistir de ser candidata.

BNews – A senhora acha que hoje aos 69 anos e tendo a vida que construiu é mais fácil recusar isso e para um jovem que inicia cheio de sonhos seja mais fácil de ser cooptado?

Eliana Calmon – Eu acho que é muito mais difícil recusar aos 69 anos do que quando você tem 20 e poucos anos. Quando se tem 20 e poucos anos você não tem nada com o que se preocupar. Tem o compromisso só com si próprio e com seus ideais. Quando se tem 69 anos, você está cheio de compromissos, até porque se tem pouca vida para aproveitar e não pode perder tempo. Com 20 anos, não pensamos que vamos viver mais 50. Com 70 anos sabemos que temos de vida útil mais uns 10 anos. E esse é o maior compromisso, o tempo. É muito mais difícil fazer o que estou fazendo hoje. Jogar para trás um tempo, dinheiro, porque tenho gasto todo o dinheiro da minha aposentadoria. Eu pago tudo o que consumo, minha gasolina, meus almoços. E no fim do mês não tenho nada. A minha família acha que isso é um absurdo. Mas eu estou conhecendo coisas que eu nunca vi. Ontem eu fui para um evento em Dias D’ávila. Cheguei no horário (em um comício) e fiquei lá sentada esperando. Eu ficava olhando aquela plateia e comecei a me imaginar fazendo o discurso. Eu estava vestida com uma saia/calça, tênis, uma roupa que eu não usava há muitos anos porque o juiz usa uma roupa formal e a forma que eu chegaria como ministra naquele ambiente era aquela que chega, dá um ‘boa tarde’ – e não está dando bola para as pessoas que estão ali. Geralmente, você vai ali cumprir com seu papel. Faz uma palestra e diz alguma coisa e acabou. Mas aí eu fiquei observando o seguinte. Eu estava lá e preciso deles todos porque todos são eleitores. Então, para você eles são todos importantes, o que não era quando eu era ministra. Eu achei super legal eu ter essa visão de povo. Porque a gente não tem essa visão de povo quando você é autoridade e eu consegui aos 69 anos voltar para fazer essa introspecção que é uma riqueza e tenho certeza de que vou sair muito melhor como pessoa. Eu não estou perdendo tempo ou dinheiro, eu estou perseguindo objetivos e se nada der certo o exemplo fica.

BNews – Seria importante para o Judiciário se aproximar e ter essa noção de povo?

Eliana Calmon – Nossa! Era tudo o que precisava. Um juiz precisa se despir da toga. Eu queria continuar na escola de magistratura para duas coisas. Uma eu fiz: dar a noção de que o juiz não vive sozinho no mundo. A magistratura brasileira é quase um modelo napoleônico. Onde ele pensa que é sozinho no mundo. Decide sozinho aquilo e acabou, não olha as consequências. Eu quis dizer aos juízes que ele faz parte de uma rede. Que existem os três poderes que se intercomunicam. O segundo passo era despir o juiz da condição de autoridade para ele viver a vida. Ele ser um cidadão brasileiro. Para quem não sabe como é o um Tribunal Superior. Tem uma estrutura de proteção ao ministro que ele não precisa fazer nada. Nós temos segurança, motorista, carro, 27 assessores. Onde passamos, os funcionários tem que abaixar a cabeça. E eu deixo isso tudo no mês dezembro e venho para a Bahia. Passei a ser consumidora. Então, não se pode julgar sem você viver.

BNews – Caso a senhora não vença essas eleições, o que pretende fazer? Vai continuar na política?

Eliana Calmon – Não sei. Eu digo que me jogo em tudo o que eu faço. Faço tudo como se eu fosse me eleger no dia 5 de outubro. Não tenho nenhum plano porque quando se faz planos se desperdiça energia. A minha energia está focada para isso. Só vou pensar nisso no dia 5. 

Fotos; Roberto Viana

Classificação Indicativa: Livre

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