Especial

"Qualquer um faria uma boa gestão após JH", critica Pelegrino

Imagem "Qualquer um faria uma boa gestão após JH", critica Pelegrino
Em entrevista ao Bocão News, Nelson Pelegrino critica administração de ACM Neto, defende Genoíno e revela que continua sonhando ser prefeito de Salvador Edição: Juliana Nobre  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 30/12/2013, às 00h00   Lucas Esteves


FacebookTwitterWhatsApp


Mais de um ano após ter sido derrotado por ACM Neto na disputa pela prefeitura de Salvador, o deputado federal Nelson Pelegrino (PT) teve tempo de avaliar o período inicial de gestão do rival. Apesar de evitar fazer críticas mais contundentes, também não se deixou levar por uma suposta onda de surpresa que contamina parte da população da capital da Bahia e disse que, na essência, qualquer pessoa poderia ter feito um trabalho melhor que João Henrique "sendo minimamente qualificado".

O petista disse não encher seus olhos o período de realizações de Neto - apesar de elogiar algumas ações - e revela o que teria feito de diferente, além da realização que não faria em hipótese nenhuma: aumento de impostos na atual condição econômica da cidade. Sobre a possibilidade de concorrer pela quinta vez a prefeito, alegou que se trata de um período longinquo demais para decisões, mas que ser comandante da capital permanece sendo seu maior sonho.

Fiel e militante do PT, Pelegrino também deixou claras suas convicções acerca do episódio do Mensalão e criticou a atuação do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim barbosa, na condução do desfecho da novela. Do outro lado, elogiou o ex-deputado José Genoíno, que luta para fixar sua pena em regime domiciliar. "
 Tem um consenso no Congresso Nacional que se chama Genoíno. Mesmo os adversários reconhecem que Genoíno é uma pessoa honesta."

Leia a entrevista na íntegra abaixo.
Edição: Juliana Nobre

Bocão News - O senhor tem visitado muito países por conta da atuação na presidência da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional. Inclusive tem ficado mais fora do que no Brasil. Qual é o balanço que o senhor faz desta fase?

Nelson Pelegrino – Foi uma experiência muito enriquecedora porque a comissão não é só de relações exteriores, mas também é de Defesa. Eu aprofundei muito meus conhecimentos. Em todas as viagens fizemos um intercâmbio parlamentar, para saber como atuam e a relação deles com o Executivo. Percebemos que o Brasil é muito respeitado no cenário internacional e muito ouvido também. Outros países esperam uma posição do Brasil para se manifestar. Veja esse episódio agora da espionagem. O Brasil, através da presidente Dilma, foi o primeiro a protestar. E depois das manifestações dela, os Estados Unidos recuaram. Não pediram desculpas, pediram à Alemanha, mas o mais importante é que países como a Holanda e Alemanha passaram a respeitar a posição brasileira, ao ponto da Alemanha ter apresentado uma resolução na Assembleia Geral da ONU dizendo que a posição do Brasil estava correta. O Brasil já vem pleiteando, desde o mandato do presidente Lula, uma reestruturação da ONU, principalmente o conselho de segurança, que tem 10 membros hoje. São cinco membros permanentes e cinco que se revezam. O Brasil pleiteia que também seja membro permanente, representando a América Latina. Teve o episódio da OMC onde o Brasil teve a capacidade de eleger o embaixador Roberto Azevedo. A movimentação em relação ao Mercosul, o respeito que o Brasil tem com os países africanos, do Oriente Médio e que cada vez mais se interessam por nosso país. Então, a gente praticou muito a diplomacia parlamentar a partir dos interesses do país e isso é muito importante. E fico muito feliz que em minha gestão na comissão ocorreram dois eventos muito importantes. O primeiro foi que aprovamos o Livro Branco que é a publicitação de sua estratégia política de Defesa. Ficou tramitando por muito tempo no Congresso Nacional, mas consegui a aprovação. Também presido a Comissão Mista de Acompanhamento das Atividades de Inteligência do Brasil. Estudei muito essa área de Defesa e tenho um conhecimento muito grande dos principais projetos estratégicos.

BNews – O senhor acha que vale a pena para o Brasil assumir o asilo para Snowden em troca de ajuda, para que ele seja nosso “hacker oficial”?

NP – Ele tem muitas informações valiosas. Se ele fizer o pedido, acho que deve-se analisar, mas acredito que dificilmente ele saia da Rússia. Eu acho que ele tem um temor que se sair de lá possa ser preso e as penas nos Estados Unidos para ele serão muito severas. Acusado de traição pode ir à pena de morte.

BNews – O senhor como analista deve ter uma opinião sobre a mudança dos diplomatas. O que mudou desde a saída do ex-ministro Antônio Patriota?

NP – Eu diria que são estilos diferentes. Mas a política externa deve continuar a mesma. Desde o governo Lula, com Celso Amorim. Ele tinha uma linha muito forte, sempre foi um formulador da nossa política externa, mas Lula deu uma ênfase à política externa como estratégia para consolidar o nosso desenvolvimento interno, e o Celso Amorim materializava muito desse desprendimento de Lula. A presidente Dilma, no primeiro momento do governo dela, não deu a dimensão que Lula deu, e cabia a ela agora pavimentar o que Lula tinha feito. Mas não tinha muita ‘liga’ entre ela e o ministro Patriota. Já com Amorim houve essa ‘liga’ e isso é muito importante para a política externa.

BNews – Em relação à diferença de estilos de presidentes, já que Lula era bastante carismático, o que o senhor tem ouvido de outros países?

NP – O ex-presidente Lula é uma figura muito respeitada no cenário internacional, muito querido. No episódio do Irã, o acordo que está sendo feito agora com os EUA é pior que o acordo que Lula conseguiu costurar com o primeiro ministro da Turquia. O acordo deles é retardado e o que Lula fez é muito melhor que o de agora. Lula sempre deu a importância
à política externa e foi um desbravador. Consolidou o Mercosul, articulou a Celac, colocou o olhar para a África, para a América Latina, para os países do Oriente. Ele tinha uma ênfase maior e para a política também como instrumento de hegemonia para o Brasil assumir seu papel no cenário internacional, se colocando como protagonista. No Fórum Econômico Mundial. Ele disse que não tinha mais essa história de G8, tem outros atores importantes e nós queremos participar. Ele propôs o G22 que acabou sendo G20, e é indiscutivelmente uma articulação importante. A presidente Dilma não. Ela já encontrou muita coisa feita. Agora ela precisa consolidar o que Lula fez. Pela característica dela, mais como gestora, no primeiro momento deu uma ênfase maior para essas questões de gestão interna, embora não tenha descuidado da política internacional, mas penso que da metade deste mandato para agora ela voltou a dar a ênfase que Lula deu. Isso é muito importante para o Brasil.

BNews – O senhor participou do processo de compra dos caças suecos?

NP – Eu acompanhei, como presidente da comissão. Estive na Suécia, onde está a fábrica da Boing - lá é fabricado o F18 Super Hornet - e na França. São três bons equipamentos, cada um com sua diferenciação. O F18 é mais testado, mas tinha restrições na transferência da tecnologia. O Rafale é testado, tinha boa disponibilidade de transferência tecnológica, mas o custo estava acima das outras duas propostas. E o New Generation é um avião em desenvolvimento, a ser construído, e se tem 40% já projetado, mas tem 60% que o Brasil poderá participar com ampla transferência de tecnologia e com uma vantagem, que eu acho que foi decisiva, não só o valor, US$ 4,5 bilhões, mas o custo de manutenção por hora voada, em torno de US$ 4 mil, o que é muito importante hoje, porque um avião desse não é só o combustível que você bota. Um avião como esse, como qualquer aeronave, depois de determinadas horas voadas precisa trocar equipamentos, mesmo que não esteja depreciado. Então essa parceria é fundamental. A Venezuela comprou Sukhoi russos que estão parados por peças de reposição. Esse processo de domínio tecnológico e de manutenção, na minha opinião, foram determinantes, assim como o preço e o compartilhamento tecnológico.

BNews - O Brasil não é uma nação militarista, expansionista , nem de guerra e agora temos esses investimentos. O que o Brasil quer exatamente, qual é o plano para usar essas armas?

NP - O núcleo da nossa política de Defesa é o que parte do pressuposto que é uma nação soberana que envolve não só a defesa do nosso território, mas da nossa população e das nossas riquezas, que não são pequenas. O núcleo dessa política é a dissuasão, ou seja, você tem o poderio do tamanho ou um poderio tal que inibe os seus adversários ou aqueles que poderão querer violar a nossa soberania. A gente quer a paz e se prepara para guerra. Temos excelentes relações com todos os nossos vizinhos, inclusive a Argentina – já que temos esse folclore com eles. A última guerra que o Brasil se envolveu foi a do Paraguai, há mais de 100 anos. E não temos nenhum inimigo externo. Por que investir na Defesa? Porque temos um território muito grande, vasto, com muitas riquezas. A nossa maior riqueza petrolífera está na plataforma marítima, que é o pré-sal. Então precisamos defender. Precisamos investir em submarinos. Estamos construindo parceria com a França para quatro submarinos convencionais e um de produção nuclear, que faz a diferença. Há ideia de construir a segunda frota. Construir fragatas, corvetas, modernização da frota. Nós temos responsabilidade por 400 milhas, em termo de salvamento, e estamos pleiteando a ampliação dessas milhas. Então precisamos de uma força para defender este território. Temos 17 mil de fronteiras secas e precisamos protegê-las. Nós temos o projeto do Sisfron, do Exército, que fará todo o monitoramento desses 17 mil quilômetros. Os caças vão defender nosso espaço aéreo. Temos o projeto do Exercito, que é o Proteger, prevê a proteção das nossas estruturas críticas, como as refinarias, usinas nucleares, hidrelétricas. A defesa tem também uma aplicação na área civil. Nesse caso da guerra cibernética. Já se fala no mundo inteiro na quarta força, além do Exercito, Marinha e Aeronáutica, tem a Cibernética. Eu vi um avião F18 que só faz ataque cibernético, ele vai neutralizando nos computadores do inimigo, pois tudo é informatizado. E o caso do Snowden nos mostrou que precisamos investir nessa área. A Petrobras foi espionada. Segredos estratégicos foram espionados. Como é que vamos negociar com os EUA se eles sabem quais são as nossas fragilidades? Então a Defesa está nesse ponto de vista. Nós temos uma relação amistosa com nossos vizinhos, não temos problemas, mas a nossa estratégia é a defesa da nossa soberania.

BNews – O Brasil tem o desejo de diminuir a participação em alguns episódios internacionais, como o Haiti, por exemplo?

NP – O Brasil aceita missões importantes para que se credencie e a cada vez mais assumir esse protagonismo no cenário internacional. Ele pleiteia uma cadeira como membro permanente da ONU e tem aceito missões com muito sucesso. No Haiti, é o Brasil que comanda as forças de estabilização. Acho que é um trabalho reconhecido. O nosso esforço no Líbano e agora no Congo. Nesse cenário internacional é importante que você cumpra missões para se credenciar e o Brasil tem feito isso. A posição do Brasil no Haiti é que queremos que as tropas sejam retiradas. Não queremos que fiquem lá. Queremos que haja a redemocratização no país, que possa construir uma força de segurança interna porque a missão lá é de estabilização. Não temos nenhuma pretensão de termos uma base.

BNews – Voltando para o Brasil. A notícia mais recente que a gente tem no governo do estado é a entrada da gestão no Cauc, o que impede recebimento de recursos...

NP – Isso é muito relativo. A Prefeitura de Salvador também vai entrar e sair do Cauc porque não é só a questão da inadimplência, da incapacidade de pagamento. Se você tem um convênio que o gestor anterior não prestou conta, você entra no Cauc. Tenho a certeza que temos uma gestão estadual responsável. Nós pegamos o estado com uma dívida de R$ 300 milhões, a Ebal quebrada e o governo recuperou. Agora é importante entender que o que temos em debilidade na saúde financeira do estado é por força de uma política social que nós fizemos. Fizemos um reajuste de quase 56% ao servidor público que impactou na Previdência. O governo vai contratar quase 14 mil policiais militares e civis. Contratou professores e uma série de profissionais para a Saúde e essas contratações impactaram. O grande problema que nós temos agora é a Previdência. Quando Wagner assumiu era um custo de R$ 300 milhões e hoje está em R$ 2 bilhões. Mas ações estão sendo tomadas para fazer o equacionamento. Eu vejo o prefeito ACM Neto dizendo ‘vamos fechar o ano no azul’, mas para isso depende muito do ponto de vista do que ele está esboçando. A prefeitura deve R$ 460 milhões e disse que pagou 20%, mas não se fecha o ano devendo esse valor. Se esse ‘fechar no azul’ é o que arrecadou foi suficiente para pagar servidor, ou fazer algum investimento, aí o estado também. O prefeito está começando a fazer política agora. Ele vai ter que contratar, ampliar serviços, fazer investimentos, tem problemas previdenciários também. Não tenho nenhuma dúvida que o governador Jaques Wagner faz uma política fiscal responsável. A debilidade pode estar nas concessões que fizemos. Umas justas e outras sob pressão da realidade social. Talvez o estado fez concessões à PM e aos professores mais do que poderia fazer devido as greves. Mas fazendo a comparação com os governos anteriores tenho certeza que o saldo é positivo.

BNews – Essa questão do Cauc impacta também nas emendas parlamentares?

NP – Tudo o que é transferência voluntária impede.

BNews – Isso chega a frustrar?

NP – Não, porque nós vamos sair do Cauc. Mas volto a dizer que essa questão é episódica. Evidente que você pode levar o estado a uma situação de inadimplência completa, mas não é o caso. A prefeitura de Salvador ficou por muito tempo porque não tinha uma política fiscal responsável. Qualquer prefeito com o mínimo de competência podia levar Salvador a uma situação de ter uma janela maior, de adimplência. Ampliar essa janela é fundamental. E hoje para o governo do estado, a adimplência é uma regra.

BNews – Agora que já passou o caso do Mensalão vamos falar sobre as consequências. Como o senhor avalia o desfecho desse caso, com todas as condenações?

NP – Há um anseio da população de combater a corrupção e a impunidade. Isso é um anseio correto. Nós não somos a favor da impunidade e nem da corrupção. Pelo contrário, o governo Lula combateu e o de Dilma combate também. Nunca houve tanta liberdade, para a imprensa, para o Ministério Público, para a Justiça Federal e outros órgãos de controle. Penso que setores da mídia tratam o episódio e falam muito desproporcionalmente em relação a outros casos muito mais graves que acontecem. Por exemplo, até hoje ainda não ficou efetivamente provado que houve dinheiro público naquele episódio. O PT pegou R$ 40 milhões emprestados ao Banco Rural e ao BMG, e pagou. O que, na minha opinião, aconteceu foi o ‘caixa 2’. Infelizmente é uma prática lamentável, recriminável, mas que ainda é praticada no Brasil e o pano de fundo disse é o financiamento privado de campanha. O PT há muito tempo defende que tenha o financiamento público e isso vai reduzir muito os problemas que nós temos hoje. Apesar isso, não vejo muito empolgação de setores da mídia para esta tese e também por outros setores da política. É um tratamento desproporcional que se dá ao Mensalão do DEM, do PSDB, que, aliás, é a matriz do que se chama de Mensalão e que começou em Minas Gerais, no governo do PSDB. O Marcos Valério começou o esquema lá e depois apresentou o esquema ao PT. Agora esse escândalo dos trens que acontece em São Paulo e que podem ter sido desviados US$ 500 milhões. É muito dinheiro. Isso é 20 vezes o que supostamente foi o empréstimo dos R$ 40 milhões. E aí é que eu acho que houve falha no julgamento, na interpretação do que aconteceu realmente A Justiça decidiu, mas se tem os embargos infringentes para se discutir, tem a revisão criminal. Mas enfim, erros aconteceram e isso é inegável. Usando a frase do ministro Barroso, eu acho que o Supremo se portou um pouco como‘ponto fora da curva’. A prática de todos os tribunais é a prisão após o trânsito ser julgado, com um preso cumprindo a pena no domicílio dele, com todos os benefícios necessários. Em um primeiro momento foi muito atabalhoado, essa é a impressão. Eu como advogado acho que houve muitos atropelos no processo das prisões.

BNews – Esse atropelo foi uma coisa patrocinada pessoalmente pelo Joaquim Barbosa?

NP – Teve muito peso pessoal, inclusive o de ser preso e não saber para onde leva-los. Delegados que receberam os presos não sabiam o que fazer. Os procedimentos foram muito atípicos, além de que a prisão de Genoíno, naquele momento, foi temerária. Ele poderia ter uma prisão domiciliar ou hospitalar e houve um temor muito grande que ele pudesse morrer na cadeia.

BNews – Por ter sido tão exposto, ele ficou conhecido de uma forma muito negativa.

NP – Tem um consenso no Congresso Nacional que se chama Genoíno. Mesmo os adversários, reconhecem que Genoíno é uma pessoa honesta. Ele chegava ao zelo de não apresentar emendas individuais. Porque desde que ele foi presidente da comissão e acompanhou o escândalo do orçamento, ele não apresentava para não ter nenhum risco de dar algum problema. É uma pessoa que tem uma trajetória. E ele foi tragado por este episódio.

BNews – Você acha que ele foi injustiçado, traído?

NP – Ele foi tragado por um esquema de campanha que todo mundo, infelizmente, mas a regra da política é essa. Claro que isso tem que mudar. E não estou aqui para tentar justificar porque quando se justifica um crime de ‘caixa 2’, aí é aceitar. Mas volto a dizer, o PT tem apresentado propostas para enfrentar a corrupção e não ficar dando remédio, mas ir à causa da doença.

BNews – O senhor teria alguma sugestão para fazer essa mudança?

NP – O PT já apresentou essa proposta. Está no Congresso Nacional. A presidente Dilma, com as manifestações, propôs a reforma política e foi até incompreendida. Por que fazer uma constituinte própria? Porque hoje, a correlação de força no Congresso não permite uma reforma política. Eu diria que 60% dos parlamentares, se não tiver financiamento privado não votam. Então, ninguém vai dar um tiro no pé, mas tem que fazer. Eu até defendi que a reforma política tinha que ser feita para 2018. E 80% das campanhas eleitorais tem financiamento privado.

BNews – E isso vai mudar?

NP – Tem que mudar porque, senão, vamos ter uma crise política neste país.

BNews – Quais as forças que saem prejudicadas com isso?

NP – Aquelas que não têm base social, nem no movimento sindical, na sociedade. Que não está em sintonia com os anseios da sociedade.

BNews – A “torto e à direito”?

NP – Tem esse tipo de atuação, de prática. Pode, eventualmente, gente dentro do PT que tenha ultrapassado essa barreira, incorporado as práticas tradicionais, mas eu diria que não é a discussão de quem será beneficiado. Beneficiada será a população, a nação, que vai ter um sistema muito mais democrático, mais limpo e transparente e que a representação será fruto, não de uma correlação de força econômica, mas da sociedade para quem tiver trabalho, proposta. Isso é realmente uma etapa que o Brasil tem que cumprir para não só estancar esses escândalos que são cíclicos, sempre, mas também para a gente poder dar um salto na qualidade da política brasileira.

BNews – Hoje se tem um entendimento diferente sobre da época da Ditadura Militar, em relação às Diretas Já, com ‘caras pintadas’. Como o senhor imagina que seja o entendimento da população sobre esse caso do Mensalão daqui a 20 anos?

NP – A impressão que eu tenho, a partir do que estudei de todo esse episódio, é que daqui a 20 anos a verdade terá mais facilidade de ser posta. Não existem verdades absolutas, mas eu diria que haverá uma pressão menor para que as pessoas, de forma mais isentas e tranquilas, analisem o que aconteceu. Hoje, o que tem de compreensão geral é muito do que os setores da mídia construíram.

BNews – Então ainda existem verdades a serem ditas?

NP – Ainda existem verdades a serem interpretadas. E volto a dizer, na minha opinião, foi um episódio de ‘caixa 2’. É errado, mas foi isso que aconteceu.

BNews – O senhor acredita que existe o Partido da Imprensa Golpista (PIG)?

NP – Eu estou lendo agora os últimos dois volumes de Getúlio, de Lira Neto, e tem algo muito interessante: sempre há nos setores da imprensa do Brasil que agem como partido político. Em todos os episódios do livro você percebe isso. Há setores da imprensa que se posicionavam, opiniões sobre alguns temas, assumindo candidaturas, fazendo papel central de oposição.
Isso é da história do Brasil.

BNews – Sobre a política na Bahia. Rui Costa é o seu candidato?

NP – Eu assumi um compromisso na eleição de 2012 de que eu não teria candidato a governador, não seria candidato se fosse prefeito de Salvador, e não usaria a força de quem teve 46,5% dos votos no segundo turno para interferir na disputa interna. Isso não quer dizer que eu não tenha participado da discussão interna e dado opiniões, mas eu não interferi na candidatura. Até porque todas as quatro candidaturas eram qualificadas e tinham condições de representar o nosso projeto. A política tem fila e eu fui destacado para cumprir um papel. Perdi a eleição por 2% com aquelas circunstâncias que todos nós sabemos, mas eu procurei ajudar uma candidatura do partido. Acredito na viabilidade da candidatura de Rui Costa. E acho que ele é o favorito no processo de disputa do ano que vem e nós vamos ganhar a eleição.

BNews – Muita gente não ficou satisfeita e o que aparentemente ficou mais insatisfeito foi Walter Pinheiro. A base parece desunida?

NP – Agora a gente tem que virar essa página e o PT tem essa característica. A gente define e se une em torno desse objetivo. Todos nós lutamos para superar uma etapa da política baiana que foi o ‘carlismo’, conseguimos derrotar em 2006. O governador Jaques Wagner iniciou um processo de mudança na cultura da política baiana com democracia, com boas relações, inclusive com o prefeito de Salvador. Eu passei quatro anos como deputado estadual e nunca fui convidado pelo governador do estado na época para subir em um palanque. A única vez que tive com Antônio Carlos Magalhães foi em uma audiência de uma greve geral, onde tinha 20 prisões e nós fomos atrás do secretário de Segurança Pública e ao chegar encontramos ACM lá. Então, essa cultura não existe mais. Aprendemos com o presidente Lula que não se deve mais olhar para trás. Mas se ele foi eleito, tem que se respeitar a vontade soberana do eleitor. Eleição é eleição, e aí cada um tem seu palanque. O governador Wagner introduziu essa cultura, ele estava em sintonia com o momento em que elegeu. Tinha a dimensão do momento que se precisava construir uma transição na cultura política da Bahia. Acho que nós invertemos as prioridades do estado, com investimentos na área social, do resgate na imensa e histórica dívida social que a Bahia acumulou durante esses anos e, evidentemente, o modelo de desenvolvimento econômico do estado, a gestão moderna, e ainda estamos nesse processo de construção. Não se constrói isso só em oito anos, é um processo. Quando eu disse, em uma entrevista que o candidato do PT não era uma mera continuação do governo atual, não quer dizer que a gente vá renunciar a herança do governo Wagner. Nós temos elementos positivos, mas o próximo governador da Bahia tem que dar um passo adiante e tem que ser uma nova etapa. É um ciclo que se esgota em oito anos. Nós vamos ter um novo governador e esse tem que dar continuidade ao nosso projeto de uma forma moderna, renovar. Agora é uma página virada. Rui é o nosso candidato e vou trabalhar para elegê-lo, com todas as forças que trabalhei sempre por todas as candidaturas. Eu já disse para ele que ele terá um deputado militante de primeira hora para qualquer missão. É assim que eu ajo. Eu sou militante. Eu perdi uma prévia para Pinheiro, mas na mesma noite eu disse a ele que poderia contar comigo e fui fazer a campanha dele.

BNews – O que o senhor pensa quando ouve dizer que Wagner foi autoritário ao “impor” Rui Costa como candidato?

NP – Eu não acho que tenha havido autoritarismo. Todos nós dizíamos que o governador tinha legitimidade para conduzir sua sucessão. Quando fizemos a reunião do diretório já existia uma maioria constituída para o secretário Rui Costa. Ele dialogou. Caetano teve legitimidade para pleitear, Gabrielli, como Pinheiro teve, e eu teria também. Não pleiteei porque acho que já tinha muita gente e teria muita confusão. E já havia assumido o compromisso e o mantive até o fim. Todos podem pleitear, mas a partir do momento que o partido decidiu, agora é hora de todos estarmos unidos em torno da candidatura de Rui Costa. Trabalhei para que tivéssemos uma decisão unitária, não tivéssemos prévia, disputas no encontro do diretório ou no encontro do partido, e agora quero ajudar para consolidar essa unidade e também ajudar na unidade dos partidos que compõem a base aliada. Rui herda algumas movimentações que fizemos antes, como é o caso do PDT, PR, PSC, que nós construímos na minha campanha de prefeito, e assim quero ajudar a consolidar essa aliança. Nós temos um problema na vice porque temos dois partidos bem grandes que são parceiros e legítimos para pleitear. Infelizmente tem uma vice só, e temos que ter maturidade. A minha tese é de que a vaga deveria ser decidida ouvindo todos os partidos que compõem a coligação e que não só se constrói a unanimidade em torno de Rui Costa, mas uma consulta aos partidos de maior ou menor grau que compõem essa coligação. Acho que deveria ser assim, muito mais do que ao candidato do governo. E quem ficasse fora a gente buscaria outras compensações no futuro.

BNews – Inclusive havia uma especulação de que Mário Negromonte assumiria a vaga do TCE, no lugar de Filemon Matos...

NP – Na verdade nós teremos três vagas no ano que vem: a vaga de Filemon, Zilton [Rocha, presidente até dia 7 de janeiro de 2014] e Paulo Maracajá [no Tribunal de Contas dos Municípios], mas eu acho que a gente precisa pensar. Na política tem que compor. Tem a vaga de presidente da Assembleia Legislativa da Bahia no futuro. Mas temos é que manter esse grupo unido e entender que política tem fila. E quando a fila está empatada a gente tem que ter maturidade e ficar com o crédito. E vai aparecer a oportunidade de ser compensado.

BNews – Após a filiação de Eliana Calmon ao PSB e o evento relacionado em dezembro, Lídice da Mata já está oficialmente fora da base. O que o senhor acha disso?

NP - Lídice é uma grande companheira, tenho um respeito muito grande por ela, um carinho. Acho que é uma grande política, foi a nossa primeira prefeita, primeira senadora. Ela tem um lugar na história da Bahia. Acredito que a candidatura de Lídice não seja de oposição ao governo Wagner, até porque não tem como. Quem está há sete anos dentro de um projeto não pode falar mal. Ela tem legitimidade, apresentou seu nome para ser candidata do nosso grupo, mas tem uma circunstância, uma contingência, que é a de estar em um partido que tem uma candidatura nacional e que precisa de uma correspondência no estado. Acho que temos que dialogar com ela e ter uma relação respeitosa, para termos uma unidade no segundo turno.

BNews – Nesse movimento, quem perdeu mais? Ela ou a base?

NP – A perda é nossa porque ela fazia parte da base e agora se descola. Mas, temos que dialogar com Lídice como aliada, parceira. Reconhecer a legitimidade da sua candidatura e assumir compromissos no segundo turno.

BNews – Qual é a sua avaliação sobre o primeiro ano de gestão de ACM Neto em Salvador?

NP – Todos nós esperávamos muito mais, mas diria que o prefeito ACM Neto tem uma grande vantagem: a de fazer uma administração depois de João Henrique. Então qualquer um que viesse depois de JH faria uma gestão melhor. Isso é óbvio. Os oito anos de administração de João Henrique não teve autoridade política, falta de ordenamento, de planejamento estratégico, de muita coisa. Algumas medidas que ele adotou qualquer um adotaria, quem fosse minimamente preparado para isso. Autoridade política, recuperar o ordenamento da cidade, adotar medidas para organizar a gestão administrativa e financeira da prefeitura. São as medidas absolutamente necessárias e qualquer um tomaria. Penso que ele fez uma reflexão sobre o discurso de campanha em relação a questão da parceria. Ele entendeu que não se governa sem o apoio dos governos federal e estadual e está procurando fazer. Agora se eu estivesse na prefeitura teria mais capacidade de fazer essa parceria do que ele, porque existiria mais identidade, mais sinergia, mais capilaridade do que ele. Ele abandonou alguns outros discursos de campanha, como alguns procedimentos na área da moralidade, por exemplo, ele quando deputado, líder do DEM, toda vez que tinha qualquer denúncia contra os membros do governo Dilma, ele era o primeiro a subir na tribuna e pedir para demitir. Ele não agiu assim como o secretário dele Mauro Ricardo. Ele se pegou a ferro e a fogo e nada abala a convicção dele de manter. Demorou muito para tirar João Carlos Bacelar. Prometeu um grande time para administrar o governo dele, mas até agora não tem. São muitas licitações, com dispensa. Esse episódio da Barra, ele usou o SDC, que é um regime que ele sempre condenou muito. Mas é o primeiro ano. É um ano de reorganização da casa, mas vamos ver os próximos três anos. Tem desafios que ainda não foram vencidos, mas também que não se pode cobrar no primeiro ano. No trânsito de Salvador houve intervenções que não deram certo, e em alguns casos piorou. A Saúde deixa a desejar. Teve uma ajudinha do governo federal, com o Mais Médicos, que ajudou, e recursos para recuperação de unidades de Saúde. Na Educação, vamos ver qual é a marca da sua administração. Na Infraestrutura, mobilidade urbana, vamos ver o que vem por aí. A cidade ainda está travada. Cajazeiras está completamente parada. Com as chuvas agora, a cidade está travada. Então nos próximos anos é que ele terá que mostrar para o que veio e se terá condições de fazer. Eles costumam bater muito na questão da Segurança Pública e eu acho que fazemos muito nessa questão, não está uma maravilha. O problema está no Brasil inteiro e a Bahia não fica fora disso. Mas eu diria que a segurança está para o estado como o transito está para a prefeitura. São problemas muito complexos para serem resolvidos e precisam de muito investimento. Mas o saldo será visto no final de cada gestão. Já falei com ele sobre a decisão do Supremo Tribunal de Justiça em relação ao IPTU de São Paulo e avaliando podemos ter a suspensão aqui também.

BNews – Vamos fazer um exercício de imaginação. Se estivéssemos no primeiro ano de gestão de Pelegrino, o que você teria feito? Os problemas seriam os mesmos, mas como você agiria?

NP – Nós estávamos dialogando com o governo do estado para incluir as obras de mobilidade, através do empréstimo que o estado tomou. Em 2012, o governo do estado definiu uma série de prioridades. Então eu teria mais capacidade de dialogar com a presidente Dilma e mais força política para arrancar desses R$ 50 bilhões para as obras de mobilidade uma boa fatia. Teria mais sintonia com o governo do estado nas áreas da Saúde, Educação, ações complementares na área de Segurança Pública e adotaria também medidas de recuperação da autoridade, da gestão administrativa-financeira. Teria discutido melhor sobre as intervenções da orla. Conversei com o prefeito sobre isso. Tem trechos na orla que as escadarias estão totalmente destruídas. Acho que temos que fazer uma recuperação não só para os baianos, mas também para os turistas. E não custa muito caro. Então, o sentimento que eu tenho quando paro para pensas é que poderíamos fazer muito mais se eu estivesse no governo.

BNews – E o que ele fez que o senhor não faria em hipótese alguma?

NP – (pausa) Neste momento, aumentar impostos em uma cidade que tem na construção civil um elemento muito importante, o aumento de ISS, de IPTU, essa indefinição em relação a Lous e PDDU pode desaquecer a atividade da construção civil. Então não daria um aumento tão grande como ele deu, eu escalonaria mais. Tem a questão dos estacionamentos, que isso é uma marca do secretário Mauro Ricardo, pois em São Paulo é assim. Só que São Paulo é uma cidade rica. Essa sanha arrecadatória deveria ter sido mais mitigada. E investiria mais na Saúde, algumas prioridades na área social. Essa área é o ponto fraco da administração dele.


BNews - Há também a questão de uma suposta falta de transparência da Prefeitura de Salvador, não é?

NP - Eu dialoguei muito com o vereador Arnando Lessa (PT) e outro dia o pedi que pesquisasse para mim os investimentos da prefeitura em determinada área. E a resposta que me veio de retorno da assessoria dele foi muito curiosa: não há instrumento de acompanhamento da execução orçamentária aqui. A gente, para poder acompanhar, tem que fazer com o método tradicional, que é ir lá no Tribunal de Contas, olhar os documentos, solicitar. E eu, que passei 16 reivindicando a senha do sistema do estado, na outra gestão, lembro que hoje você tem um sistem aque vai lá e vê toda a execução orçamentária do governo federal, estadual, e aqui ocorre pela Transparência Bahia. Então nós estamos lançando uma campanha para que o Município também disponibilize todos os seus dados da execução orçamentária, para que qualquer cidadão possa saber realmente como estão sendo realizados os gastos do Município.

BNews - E por que o prefeito ainda não fez isso?

NP - Esta é uma pergunta que ele precisa responder. Eu fiz essa pergutna e ele não respondeu, então etá em aberto. Ano que vem quero debater isto com a bancada de oposição para saber o que poderemos fazer. Tem uma lei do acesso à informação - que ele inclusive fez - que foi regulamentada, se não me engano em agosto, e até hoje um dos aspectos desta lei era a disponibilização destes dasdos, que até hoje não foram. Então eu espero que a prefeitura ano que vem coloque todos os seus dados online em tempo real para que todo mundo possa ser acesso, como ocorre no plano federal.

BNews – O senhor disputou quatro eleições para prefeito no passado e é de e imaginar que esteja mais maduro. Que lições ficaram com essas derrotas?

NP – Muitas. São quatro eleições completamente diferentes. A primeira foi heroica, em 1996. Agente deixou de ir ao segundo turno por 1%. Foi uma eleição muito tumultuada. Eram outros tempos de justiça eleitoral, mas começamos com 4% e fomos a 25%. Em 2000, foi também contra tudo e todos. Enfrentamos a máquina da prefeitura, dos governos estado e federal e mesmo assim tivemos 35% dos votos. 2004 foi uma grande chance que nós desperdiçou por uma conjuntura nacional que nos fragilizou, mas também por falta de visão da esquerda, porque se eu e Lídice tivéssemos saído na mesma chapa tínhamos ido para o segundo turno com chances de vitória. Poderíamos juntos ter ido com 35% dos votos, João Henrique com 39%, mas teríamos o apoio de Lula. E agora, em 2012 faltou 2% no segundo turno, a melhor performance do PT e o que teve um peso grande já na reta final foi a greve dos professores e da Polícia Militar. Bom, faltou voto, temos que reconhecer isso. Mas chegamos muito mais perto. É um sonho do PT governar Salvador. Há um sentimento de viver essa experiência. A lição que fica é que temos que consertar os erros que foram cometidos. Agora, a cada eleição, o meu compromisso com a cidade aumenta, meu carinho também. A cada eleição eu ando mais na cidade, assumo mais compromisso, ando mais com a população. Isso implica em uma relação que nunca vai mudar e nada vai me impedir de ser um político da cidade que se preocupa e tem um grande carinho. Digo de coração que eu espero que essa administração dê certo porque é para a cidade. Eu fico muito triste de ver Salvador na situação que ela se encontra. Eu viajo o mundo inteiro e vejo como as cidades são. Então eu vejo as belezas de Salvador, seu potencial, e se a cidade for bem cuidada será bom para todo mundo. Vou trabalhar para que a cidade tenha melhorias para que ela assuma esse potencial, de serviços, de ser uma cidade turística.

BNews – A gente pode imaginar Pelegrino no quinto round para prefeito?

NP – É muito difícil ter essa previsão agora. Vontade de ser prefeito tenho pois sou apaixonado por essa cidade. Toda vez que eu ando por Salvador percebo o carinho das pessoas e isso me deixa com mais vontade de fazer pela cidade e tenho trabalho muito. Qualquer candidato para a eleição é muito forte e não tenho duvida que ACM Neto seja um candidato forte, mas não me impediria de disputar. Mas ainda tem muita água para rolar até 2016. Meu empenho agora é a eleição em 2014 para o governo, ajudar a eleger o senador da nossa chapa e trabalhar para a minha reeleição e depois disso temos que analisar a conjuntura. Não está definido que serei, mas também não dá para dizer que não serei. Temos que avaliar com os partidos qual é a candidatura que tem melhor condições de disputar. Estou aberto para isso.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp

Tags